Projetos de lei preveem abertura de materiais adquiridos pelo poder público

Publicado em Observatório da Educação em 23/10/2014

Propostas estão em tramitação nas Assembleias Legislativas do Paraná, de São Paulo e do Distrito Federal e na Câmara dos Deputados

Desde 2011, iniciativas de incorporação de Recursos Educacionais Abertos (REA) às políticas públicas de educação se proliferaram pelo país, com o objetivo de tornar os materiais produzidos ou adquiridos pelo Estado em bens públicos. Há hoje, propostas estão em tramitação nas Assembleias Legislativas dos estados do Distrito Federal, do Paraná e de São Paulo e na Câmara dos Deputados.

No âmbito federal, o Projeto de Lei Federal nº 1513/2011, de autoria do deputado federal Paulo Teixeira (PT/SP), prevê que obras intelectuais subvencionadas pelos entes do poder público tenham os direitos autorais comprados pela administração para que possam ser disponibilizadas para a sociedade em licenças livres, desde que não seja para fins comerciais. Desde junho de 2013, a proposta aguarda primeiro parecer na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados. Ele passará, em seguida, pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania.

Se aprovada, a lei deverá mudar a lógica do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), que hoje tem sido uma das principais fontes de lucros para as editoras, por meio do pagamento de direitos autorais. Pelas regras atuais dos editais do Programa, os autores devem ceder à editoras todos os direitos autorais, pelos quais o governo paga novamente a cada ano. Somente em 2013, o Programa pagou mais de R$ 862 milhões para as editoras pela compra de 132.670.307 para serem distribuídos aos alunos dos ensinos Fundamental e Médio nas modalidades regular e Educação de Jovens e Adultos (EJA).

No estado de São Paulo, o Projeto de Lei nº 989/2011 foi o que mais chegou perto de tornar-se realidade. No dia 2 de maio de 2012, ele foi aprovado, em tramitação conclusiva pela Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento da Assembleia Legislativa do estado. Após encaminhamento ao Executivo, contudo, o projeto foi vetado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB).

O projeto previa que fosse considerado um recurso aberto todo o conhecimento que for comprado ou desenvolvido com recursos públicos pela administração pública estadual. De acordo com o texto de veto,  o motivo para a rejeição do projeto seria o “vício de origem”: somente o Executivo teria competência para propor medidas referentes ao “uso da informática e da Internet” em suas atividades. O texto ainda evoca a Constituição Federal, que diz que “a gestão administrativa dos negócios do Estado constitui matéria de competência privativa do Governador”. Leia o texto do veto na íntegra e matéria completa que o Observatório da Educação publicou à época.

Para Sérgio Amadeu, especialista em tecnologias livres e professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), as motivações para o veto foram políticas: “Na verdade, o lobby da indústria do copyright trabalhou nos bastidores. Deviam apenas ter escrito os reais motivos do veto que é continuar pagando diversas vezes a licença anual do mesmo material didático”. Em reação ao veto, quarenta coletivos e organizações brasileiras e internacionais encaminharam carta elaborada pela Comunidade de Recursos Educacionais Abertos (REA-Brasil) ao governador de São Paulo, pedindo a aprovação do projeto de lei e defendendo a “igualdade de acesso ao conhecimento, direito à educação, estímulo à criatividade e inovação e melhor aproveitamento de recursos públicos”.

Outras proposições

Além do Projeto de Lei do estado de São Paulo, ainda há outras duas proposições legislativas que tratam do tema tramitando nas Assembleias do Distrito Federal e do Paraná, além de um Decreto Municipal na cidade de São Paulo.

O Decreto nº 52.681, de 26 de setembro de 2011, da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, assinado pelo então prefeito Gilberto Kassab (PSD), estabeleceu política pública de REA para todas as obras intelectuais produzidas com objetivos educacionais, pedagógicos e afins, no âmbito da rede pública municipal de ensino de São Paulo.

Já o Projeto de Lei do Distrito Federal nº 1832, de 13 de março de 2014, pretende instituir política de disponibilização de recursos educacionais comprados ou desenvolvidos por subvenção da administração direta e indireta estadual, assim como o Decreto nº 52.681/2011, da prefeitura de São Paulo. Ela aguarda parecer da Comissão de Educação, Saúde e Cultura, na Cârama Legislativa.

Por fim, o mais recente projeto de lei sobre o tema foi apresentado no Paraná. OPL nº 185/2014, que faz a mesma proposta que o Projeto de Lei do DF e o Decreto Municipal de SP, encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do estado, aguardando parecer do relator.

Estudo indica que muitos recursos educacionais digitais têm restrições de uso e distribuição

Pesquisa mapeou 22 portais de recursos educacionais. Apesar da intenção de liberar conteúdos, desconhecimento de licenças livres e Lei de Direitos Autorais restritiva ainda são desafios para a abertura de materiais para uso educacional


Publicado em Observatório da Educação em 23/10/2014

Debate Desafios da Conjuntura, promovido pelo Observatório da Educação na terça-feira (10/09), apresentou os resultados da pesquisa Recursos Educacionais Abertos no Brasil: o campo, os recursos e sua apropriação em sala de aula (veja aqui a publicação do relatório). O estudo, que procurou mapear os principais atores do campo dos Recursos Educacionais Abertos (REA) no país e desafios para apropriação destes materiais, revela que, embora haja intenção de liberar conteúdos em 49,3% dos recursos educacionais analisado analisados, 43,7% ainda tinha todos os direitos reservados, aumentando a insegurança jurídica de seu uso educacional.

Segundo a definição da Unesco, os REA são materiais de ensino, aprendizagem e pesquisa – digitais ou não – que são disponibilizados de modo a permitir seu uso, adaptação e redistribuição de forma gratuita, geralmente em licenças Creative Commons (saiba mais aqui). Seu princípio é o de considerar livros didáticos, artigos de pesquisa, vídeos, testes, softwares e qualquer outra ferramenta, material ou técnica como bens públicos, com nenhuma ou o mínimo de restrições possíveis.

A pesquisa, realizada pela Ação Educativa com apoio da Wikimedia Foundation, analisou 22 portais de recursos educacionais on-line (em sua maioria voltados à educação básica) e 231 recursos educacionais abertos, com objetivo de mapear as produções existentes no que diz respeito à sua missão, aos tipos de licença adotadas, a que etapas e modalidades da educação são direcionadas, em que áreas do conhecimento, se permitem ou não a colaboração dos usuários, quais são os critérios de busca e se possuem algum tipo de suporte específico para o uso em sala de aula.

Um dos itens analisados pela pesquisa foi a condição dos direitos autorais dos materiais encontrados, considerados uma das principais barreiras à circulação deste materiais. O estudo revelou que, dos recursos educacionais disponíveis nos portais analisados, 43,7%, tinha direito autoral padrão (todos os direitos reservados); 13,4% detinha direito autoral padrão com intenção de flexibilizar; 22% com recursos licenciados de forma flexível (Creative Commons, atribuição, não comercial e/ou sem derivações); 10,8% eram de domínio público; e somente 4,3% disponibilizam os recursos de forma livre (Creative Commons, atribuição; e Creative Commons, atribuição, compartilha igual). O restante, 5,6%, não foi possível determinar.

A pesquisa também ouviu 30 pessoas, entre pensadores que lidam direta ou indiretamente com REA, produtores de conteúdos educacionais digitais e gestores públicos, com o objetivo mapear posições sobre a produção e circulação destes materiais. Representantes de organizações da sociedade civil e da academia identificaram que a falta de conhecimento sobre como se licenciar uma obra é uma das principais barreiras para o avanço dos REA no Brasil. Ainda que a maioria dos portais expressem em sua missão a intenção de fazer circular o conhecimento e promover o direito à educacão, predominam recursos sob o direito autoral padrão. Em alguns casos há uma tentativa de se colocar uma licença alternativa que falha em se cumprir por falta de conhecimento sobre licenças flexíveis.

“Por outro lado, o número mostra que há uma consciência sobre a necessidade de se flexibilizar os direitos autorais e um conhecimento genérico sobre as licenças alternativas que, por vezes, esbarra em uma legislação excessivamente restritiva. Caso a intenção de flexibilização tivesse de fato se materializado, o número de recursos flexíveis, livres, e em domínio público superaria o de conteúdos protegidos, chegando a quase 50% da amostra analisada”, aponta o relatório.

REA e direito à educação

Segundo a coordenadora da pesquisa, Jamila Venturini, todos os entrevistados encaram os REA como um dos desafios a se considerar para que haja uma transformação estrutural da escola. “Para muitos entrevistados isso tem a ver com uma mudança na cultura escolar, na transformação das relações entre professores e alunos, na superação da relação entre recepção e transmissão da informação e do conhecimento”, explicou durante o debate de lançamento da pesquisa (leia aqui o texto de cobertura). “Talvez a gente tenha um sistema que não necessariamente valoriza o professor nesse papel de criação de conteúdo, de intelectual.”

Para Priscila Gonzalez, coordenadora do Instituto Educa Digital e membro da Comunidade REA Brasil,ainda que o uso de recursos educacionais abertos seja pequeno no Brasil, há muito uso de objetos digitais em sala de aula. Segundo ela, os professores criam muitos objetos, mas compartilham pouco. “Os professores não se reconhecem como autores, a autoria vem de fora. Esse é o ponto mais importante quando a gente fala de educação aberta e de REA. É mais do que licença, é valorizar o ponto de vista pedagógico que essa a questão traz”, defendeu.

Segundo dados da pesquisa TIC Educação de 2013, 96% dos 1.987 professores da educação básica entrevistados em todo o país utilizam recursos obtidos na internet para a preparação de suas aulas ou para a realização de atividades com alunos. A maioria deles, 82%, já produzem conteúdos para suas aulas ou atividades com alunos com o auxílio das novas tecnologias.

Quando o assunto é a possibilidade de interagir com o material, criando novas versões e obras derivadas, 88% declararam fazer alterações nos materiais originais, contra 11% que não o fazem e somente 1% que acredita que não é possível editar ou usar os conteúdos de um modo diferente. Apenas 21% deles, porém, os publica as obras derivadas de alguma maneira.

Educação e direitos autorais

Considerada a quarta mais restritiva do mundo, segundo levantamento do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpopai) da USP, a atual Lei brasileira de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998) impõe uma série de limitações ao uso de recursos com fins educacionais. Pela lei atual, filmes e músicas, por exemplo, só podem ser usados em atividades educativas com autorização do autor. Paródias ou uso de trechos por parte de alunos para criar produções próprias também são proibidas.Também não é possível copiar integralmente obras que ainda não estejam sob domínio público, ainda que para uso educacional. A única exceção é a reprografia (xerox) de “pequenos trechos”, feitos pelo próprio copista.

De acordo com a Rede pela Reforma da Lei de Direitos Autorais, que atuou durante debates de reformulação de lei a partir de 2007, a legislação atual é extremamente tímida ao tratar do direito de pessoas com deficiência. “Somente pessoas com deficiência visual são citadas nominalmente – mas mesmo nesse caso a legislação não prevê fiscalização para garantir que os detentores de direitos atendam suas necessidades. Assim, por exemplo, há grande dificuldade para que essas pessoas consigam de editoras versões digitais de livros para gerar versões em braile ou em áudio”, afirmam as entidades da rede, em publicação sobre o tema.

Em debate realizado pelo Observatório durante o processo de reformulação da Lei de Dirietos Autorais (LDA) em 2010, Carlos Affonso, professor de Direito da Faculdade Getúlio Vargas, apontou como estas restrições podem impactar a realização do direito humano à educação por limitar a circulação das obras. “Atualmente há desequilíbrio entre o incentivo à criação e o acesso ao conhecimento e à informação”, diz.

Em 2007, o Ministério da Cultura criou o Fórum Nacional do Direito Autoral, com o objetivo de promover e debater uma reforma da LDA atual. Após uma série de seminário, conferências e consultas, o Ministério da Justiça preparou um anteprojeto de reforma do direito autoral, que foi submetido à consulta pública em 2010. A proposta previa, entre outros pontos, que a possibilidade de exibição de filmes e de execução de músicas sem a autorização do autor para fins educacionais, a autorização para que bibliotecas, museus e outros órgãos de preservação do patrimônio cultural pudessem fazer cópias de obras que poderiam se perder, e a cópia livre de obras esgotadas, desde que sem fins comerciais, como é prática comum no ensino superior.

Em 2010, no entanto, a então Ministra da Cultura Ana de Hollanda brecou o processo de reforma da reforma da lei, que só voltou a ser debatida em outubro de 2012, na gestão de Marta Suplicy, que realizou uma série de modificações na proposta. O anteprojeto está agora na da Casa Civil e aguarda há algum tempo para ser enviado ao Congresso.

REA e políticas públicas

Apontados como alternativas às restrições do direito autoral e ao engessamento da escola, diversos projetos de lei, nos âmbitos federal, estadual e municipal, procuram incorporar a lógica de abertura e a flexibilidade das licenças livres dos REA às políticas públicas. O estado de São Paulo chegou a ter aprovada a lei nº 989/2011, que previa que fosse considerado um recurso aberto todo o conhecimento que for comprado ou desenvolvido com recursos públicos pela administração pública estadual. No entanto, ela foi vetada pelo governador e aguarda possibilidade de derrubada do veto pela Assembleia Legistativa do estado. Há ainda iniciativas no Distrito Federal e no Paraná. No âmbito federal, o Projeto de Lei Federal nº 1513/2011 está em tramitação da Câmara (saiba mais detalhes sobre os projetos).

Recursos abertos podem ajudar na transformação da escola, apontam especialistas e docentes

Publicado em Observatório da Educação em 23/10/2014

Durante o debate de lançamento da pesquisa “Recursos Educacionais Abertos no Brasil: o campo, os recursos e sua apropriação em sala de aula (saiba mais)”, na terça (30/09), Jamila Venturini, coordenadora do estudo, apontou que nenhum entrevistado discordou da necessidade de transformação da escola e que todos veem a incorporação de Recursos Educacionais Abertos (REA) como um dos desafios. A percepção também se refletiu na fala dos debatedores presentes no evento.

De acordo com Jamila, as entrevistas da pesquisa apontaram para uma necessidade de transformação estrutural da escola em detrimento de uma transformação superficial. “Para muitos entrevistados isso tem a ver com uma mudança na cultura escolar, na transformação das relações entre professores e alunos, na superação da relação entre recepção e transmissão da informação e do conhecimento”, explicou, apontando como os REA podem contribuir para isso.

Para Fernando Almeida, diretor de orientações técnicas da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, os REA retomam o princípio de que, em um produto de qualquer natureza, toda a humanidade teve participação indireta em sua construção. Assim, todos fazem parte de uma ampla rede de produtores de conhecimento. “Esse é o caminho para a gente pensar na estrutura de todo o edifício de opressão e de propriedade exclusivista para a construção de uma sociedade em que a liberdade possa ser a pauta do nosso relacionamento”, explicou.

REA na escola

Alessandro Freitas, professor de história na educação básica, pôs em evidência a possibilidade do uso de REA na sala de aula como um passo importante para a reforma educacional, que se faz urgente. Nesse sentido, explicou que a situação de sala de aula é um desgaste e uma agressão tanto para os alunos quanto para os professores, porque a escola, por não absorver as mudanças que têm ocorrido de forma acelerada na sociedade, principalmente no que tange as tecnologias e a internet, está fora da realidade cotidiana dos alunos.

Ele questionou também o uso de material didático – seja apostilado ou em livros – escolhido e entregue sem a participação do professor e do próprio aluno que, segundo Alessandro, são os principais sujeitos da educação. “Os recursos educacionais abertos são uma oportunidade para os dois voltarem a ser o centro da educação. Quando os alunos percebem que estão fazendo parte, eles se interessam mais, participam mais; e ter conhecimento sobre esse tipo de licença é interessante tanto o rofessor quanto para o aluno”, conclui.

Priscila Gonsales, coordenadora do Instituto Educadigital e membro da comunidade REA Brasil, aponta que, embora a difusão dos REA ainda seja pequena no Brasil, há muito uso de objetos digitais em sala de aula. Segundo dados da pesquisa TIC Educação de 2013, 96% dos 1.987 professores da educação básica entrevistados em todo o país utilizam recursos obtidos na internet para a preparação de suas aulas ou para a realização de atividades com alunos. A maioria deles, 82%, já produzem conteúdos para suas aulas ou atividades com alunos com o auxílio das novas tecnologias.

Quando o assunto é a possibilidade de interagir com o material, criando novas versões e obras derivadas, 88% declararam fazer alterações nos materiais originais, contra 11% que não o fazem e somente 1% que acredita que não é possível editar ou usar os conteúdos de um modo diferente. Apenas 21% dos que integram, porém, publica as obras derivadas de alguma maneira.

Para ela, “os professores não se reconhecem como autores, a autoria vem de fora. Esse é o ponto mais importante quando a gente fala de educação aberta e de REA. É mais do que licença, é valorizar o ponto de vista pedagógico que essa a questão traz. É um caminho muito longo ainda a percorrer, os professores precisam aprender a usar. Eles podem ser produtores usando o que já existe”. Jamila concordou que esse papel faz muito sentido ao professor, mas questionou: “talvez a gente tenha um sistema que não necessariamente valoriza o professor nesse papel de criação de conteúdo, de intelectual”. Nesse sentido, Luiz Augusto Pereira, membro da comunidade Wikimedia, ressaltou a importância de os professores também compartilharem suas produções, publicando seus conteúdos na internet.

Já Carlos Seabra, Coordenador Técnico Pedagógico da Editora FTD, acredita que os professores estariam despreparados para lidar com as tecnologias, mas que seus alunos o estão. Ele sugere que a mudança possa começar justamente pelo processo de apropriação do conteúdo e de sua produção. “Einstein já dizia: mais importante que conhecimento é imaginação. É preciso ter imaginação pedagógica”, afirmou.

Para Priscila, porém, o professor já “está digital” no meio fora da escola e mantém o modelo tradicional de ensino por conta do ecossistema da educação,  das avaliações tradicionais, do receio de utilizar os aparelhos móveis. “E o professor está sozinho, a gente não tem política pública de formação que estimule a colaboração entre os professores, ele não tem estímulo para que essa colaboração aconteça”, argumentou, apontando que a formação continuada é a chave para a questão.

Incidência política

De acordo com Oona Castro, coordenadora do Programa Catalisador da Wikimida no Brasil, um dos achados da pesquisa foi a existência de poucos recursos, na língua portuguesa no Brasil, que podem ser incorporados pelos projetos Wikimedia por questões de licenciamento. “Esse retrato de como o campo tem atuado é fundamental para a gente pensar a incidência política. Para a própria comunidade Wikimedia, e que tiver vontade de incidir sobre a construção do campo de REA, esse é um diagnóstico que dá a dimensão do quadro de hoje”, explicou.

Denise Carreira, coordenadora do programa de educação da Ação Educativa, enfatizou também a importância do trabalho para aprofundar a atuação das organizações do campo educacional. “Conseguimos que, no substitutivo do Plano Municipal de Educação de São Paulo, fosse incorporada a agenda de REA, e estamos levando isso também para o debate nacional, inclusive sobre a base curricular nacional comum, um debate muito importante que vai acontecer nos próximos dois anos no Brasil como decorrência da aprovação do Plano Nacional de educação”, concluiu.

Recursos Educacionais Abertos

Texto de Maurício Massaru Arimoto* publicado no Estadão em 24/10/2014
Obs: Esse texto não possui licença aberta

O rápido avanço nas tecnologias computacionais e de comunicação tem alterado de forma significativa o modo com que a sociedade se comunica e conduz seus negócios. De forma análoga, a área de educação tem passado por transformações ao longo dos anos, como resultado da evolução dessas tecnologias: a educação na sociedade contemporânea tem sido caracterizada pela maior adoção de tecnologias computacionais e de comunicação que facilitam o acesso à informação e ao conhecimento e incentivam a colaboração e a cooperação.

Recursos Educacionais Abertos (REAs) surgiram dentro desse contexto, abrindo novas possibilidades para a produção e partilha de conhecimento. Eles permitem que o processo de aprendizagem seja aberto e flexível, oferecendo oportunidades adequadas e adaptadas às necessidades individuais. Práticas educacionais abertas, em especial aquelas fundamentadas na construção e adoção de REAs, oferecem oportunidades de inovação em diferentes níveis e modalidades de ensino, com impacto significativo na educação.

Quando nos referimos a REAs, estamos falando em qualquer recurso educacional disponibilizado de forma livre e aberta, com pouca ou nenhuma restrição quanto ao seu (re)uso, modificação, adaptação e (re)distribuição. Sua disponibilização geralmente ocorre por meio do uso de uma licença aberta, nos mesmos moldes das licenças de software livre. Um REA pode incluir desde simples notas de aula / slides de apresentação, imagens ou arquivos de áudio e video até livros didáticos e cursos completos, bem como ferramentas usadas como apoio à sua construção e disponibilização.

Além das questões legais inerentes ao uso de licenças abertas, REAs são (ou pelo menos deveriam ser) acessíveis e disponibilizados em formatos que não dificultem sua modificação e conversão para outros formatos. Desse modo, o uso de formatos abertos / software livre é pré-requisito para a construção e disponibilização de REAs, aumentando o seu potencial e capacidade de reúso e adaptação.

Avanços na área de REAs vêm sendo motivados principalmente pelas restrições impostas pelo modelo de ensino tradicional e pela necessidade de partilha de conhecimento livre. REAs promovem a ideia de amplo acesso e participação de todos os cidadãos na educação. Como REAs são usualmente disponibilizados no formato digital, basta o usuário possuir acesso à Internet para poder usufruir deles, independentemente de seu tempo disponível ou localização geográfica.

Outro ponto a ser destacado no contexto de REAs é a possibilidade de aumentar a eficiência e a qualidade do recursos educacionais disponíveis. Esses recursos podem ser reutilizados e revisados constantemente por diferentes usuários, mantendo-os sempre atualizados.

Também não podemos deixar de destacar o fator custo. REAs minimizam a dependência sobre os livros comerciais (que são caros) e, por consequência, diminuem os custos de produção dos materiais necessários.

E onde podemos encontrar REAs para que possamos reutilizar e adaptar de acordo com as nossas necessidades?

Existem diversos mecanismos que facilitam a busca por REAs, incluindo mecanismos de busca especializados tais como Creative Commons Search e Open Courseware Consortium, meta-buscas integradas tais como OER Dynamic Search Engine, plataformas e repositórios institucionais tais como MIT Open Courseware, OpenLearn, Open Learning Initiative, Connections e Jorum, sites de projeto ou bibliotecas digitais tais como OER Commons e Commonwealth of Learning, além de buscas de mídias específicas ou ferramentas de compartilhamento tais como SlideShare e Flickr.

Apesar de todos os benefícios que REAs podem agregar à educação em nível global, o desenvolvimento e o uso efetivo de REAs ainda é limitado. Nós podemos ajudar na disseminação da cultura “REAs”. Cabe a cada um de nós, estudante, professor, pesquisador, entusiasta e cidadão em geral, buscar um maior engajamento no sentido de incentivar e promover o (re)uso, a produção e compartilhamento de REAs na nossa escola, universidade ou comunidade, ampliando as possibilidades de adoção e disseminação de REAs.

*Maurício Massaru Arimoto é Doutorando em Ciências de Computação no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC/USP)