Professoras criam guia para ensinar docentes da Educação Especial a produzir e utilizar Recursos Educacionais Abertos.
Em 2014 o Plano Nacional de Educação (PNE) entrava em vigor no Brasil. Em sua quarta meta, o PNE determinava que a população de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação deveriam ter acesso à educação básica e a um atendimento educacional especializado, de preferência na rede regular de ensino. Algumas das estratégias dispostas no Plano para que esta meta fosse alcançada foram a implementação de salas de recursos multifuncionais, disponibilização de material didático próprio e de recursos de tecnologia assistiva. Esse conjunto de recursos são essenciais para que as necessidades educacionais especiais que esses alunos possuem possam ser melhor atendidas, permitindo assim que haja uma melhor inclusão desses alunos dentro de salas de aulas da rede regular de ensino.
Dentro desse contexto de utilização de diferentes tipos de recursos como ferramentas pedagógicas, os Recursos Educacionais Abertos (REA) são importantes porque podem ser modificados graças ao uso de licenças abertas e de formatos abertos, que facilitam a manipulação e alteração do recurso.
Portanto, é necessário que as professoras e professores da educação básica estejam capacitados para conseguir alterar e adaptar os REA de modo que eles consigam atender da melhor forma as necessidades educacionais dos estudantes, tornando a educação cada vez mais inclusiva e de qualidade para todos. Então, pensando nisso, as professoras Elma Cristina Pessoa de Queiroz e Ana Paula Costa Rodrigues, alunas do Mestrado Profissional em Educação da UnB, escreveram um guia para orientar professores e professoras da Educação Especial sobre como desenvolver e adaptar Recursos Educacionais Abertos e pode ser acessado neste link.
Esse projeto faz parte de nossas ações sobre acessibilidade e REA. Veja mais em nosso espaço dedicado ao tema!
A inclusão de alunos com deficiência na Educação Básica tem aumentado nos últimos anos. Nos anos de 2014 a 2018, o número de matrículas de estudantes com necessidades especiais cresceu 33,2% em todo o país, segundo dados do Censo Escolar, publicados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP¹). No mesmo período, também aumentou de 87,1% para 92,1% o percentual daqueles que estão incluídos em classes comuns.
Por lei, pelo Plano Nacional de Educação (PNE), o Brasil deve incluir todos os estudantes de 4 a 17 anos na escola. Os estudantes com necessidades especiais devem ser matriculados preferencialmente em classes comuns. Para isso, o Brasil deve garantir todo o sistema educacional inclusivo, salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados.
O aluno com deficiência tem direito à educação regular na escola, com aulas dadas pelos professores, e atendimento especializado que não é responsabilidade do professor de sala de aula. O estado oferece assistência técnica e financeira e também deve oferecer um cuidador, que nada mais é do que uma pessoa para ajudar a cuidar do aluno. Além disso as condições de infraestrutura adequada e materiais de apoio à prática educativa também devem ser garantidas.
Um material pedagógico adaptado serve como auxiliar da ação docente na busca de resultados em relação à aprendizagem de conceitos e ao desenvolvimento de habilidades além de desempenhar um papel essencial nos programas direcionados a atender as necessidades especiais dos educandos, percebendo estes em toda a sua singularidade.
Cumpre observar que, entre a grande variedade de recursos existentes, destaca-se o material pedagógico adaptado que contribui significativamente para o enriquecimento das “experiências de aprendizagem mais diversificadas, constituídas de sentidos e significados” (SANTA CATARINA, 1995:37).
Nesse sentido, oportuno ressaltar que o ano de 2017² marcou o ano em que uma série de documentos e recomendações foram lançados com fins de orientar governos de países a promover o uso de licenças abertas para recursos educacionais adquiridos com fundos públicos. Nessa esteira os Recursos Educacionais Abertos (REA) destacam-se como um dos pilares para uma Educação de Qualidade, prevista no Objetivo 4 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas.
O conceito de REA tem duas premissas básicas³: licenças de uso que permitam maior flexibilidade e uso legal de recursos didáticos; e abertura técnica, no sentido de utilizar formatos que sejam fáceis de abrir e modificar em qualquer software.
Diante da oferta e disponibilidade de obras pedagógicas e literárias em licença aberta e da pouca oferta de material didático voltado para alunos especiais; como adaptar esses materiais em apoio às atividades pedagógicas?
Neste contexto nasceu o presente material de apoio, com um plano de aula específico para a audiodescrição e legendagem, a fim de exemplificar os recursos utilizados.
Fundamentação para adaptação de material em REA
Pessoas que possuem necessidades especiais, tais como: Os alunos com deficiência física, intelectual, visual, auditiva, múltiplas, transtornos do espectro autista (TEA) e também alunos com altas habilidades/superdotação são público-alvo do Atendimento Educacional Especializado.
Dentro deste enlace, é possível inferirmos que pessoas que portem uma necessidade especial sejam tratadas em analogia aos deficientes visuais, quanto à adaptação, reuso de materiais, conforme a Legislação sobre Direitos Autorias (LDA). Este tema é fruto de inquietações e não há nada estabelecido legalmente.
Há legislação que ampara a educação democrática e extensiva aos alunos com necessidades especiais, dentre eles destacam-se:
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS
DECRETO LEGISLATIVO Nº 261, de 2015
LEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998
LEI Nº 13.146, DE 6 DE JULHO DE 2015
REA e o PNLD
A disponibilidade de materiais adaptados para alunos com necessidades especiais ainda é escassa, sobretudo ao se falar em REA. Com isso, vemos a necessidade de ampliação do tema.
Nesse contexto, podemos citar o Programa Nacional do Livro e Material Didático (PNLD), que é um dos maiores programas de distribuição de livros e materiais didáticos do mundo, tendo em 2019 atendido mais de 147.000 escolas e mais de 35.000.000 de alunos da rede pública brasileira.
Em 2017, foi publicado o Decreto 9.099/2017⁴ que dispõe sobre regras e etapas do PNLD. Neste normativo são enfatizados os objetivos e diretrizes do Programa dentre os quais cabe destaque a busca pela melhoria da qualidade da educação e do material de apoio à prática educativa, a democratização do acesso às fontes de informação e cultura e a garantia de isonomia nos processos do programa.
Ademais, em seus artigos finais, o Decreto ainda vincula o Ministério da Educação (MEC) à adoção de mecanismos para promoção da acessibilidade no PNLD, destinados aos estudantes e aos professores com deficiência, devendo os editais do programa prever obrigações quanto ao fornecimento de obras em formatos acessíveis.
Constatamos que os editais do PNLD trazem a premissa quanto ao atendimento da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Lei nº 13.146/2015, sendo exigido das editoras que as obras aprovadas (físicas ou digitais) também sejam fornecidas em formato acessível – EPUB3⁵, além das demandas específicas por obras em Língua Brasileira de Sinais – Libras.
Apesar dessa exigência, percebe-se que o PNLD ainda carece de proposições que exijam e regulamentem a reprodução de materiais e principalmente a possibilidade de adaptações aos materiais didáticos ofertados pelo programa.
Oportuno destacar que somente a partir de 2017, por meio do PNLD 2019, o MEC passou a exigir algum material licenciado em Creative Commons. Desde então, apenas os materiais digitais complementares, destinados ao professor, que compõem as coleções de livros didáticos, é que são REA. A intenção do MEC é que os materiais adquiridos no PNLD fiquem disponíveis em plataforma do MEC – RED⁶, acessível para toda a sociedade, até mesmo para pessoas que não estão matriculadas nas instituições de ensino regulares. Essa disponibilização ampla também possibilitará que professores publiquem e compartilhem seus recursos como REA.
Assim, percebe-se que mesmo com sua amplitude e indiscutível alcance nacional, o Programa Nacional do Livro e do Material Didático ainda contém restrições no que tange à acessibilidade/abertura.
Dentro disso, é necessário que se inclua, se amplie a utilização de recursos que atendam à acessibilidade em todas as suas formas.
Neste contexto, considerando que até a publicação deste Guia o conteúdo do Material Digital do PNLD 2020 não tinha sido disponibilizado, as adaptações visando acessibilidade que são sugeridas serão realizadas com materiais didáticos licenciados em REA e disponibilizados pelas editoras, representantes ou detentoras de seus direitos autorais.
Adaptando REA – Recursos e Processos
Conforme anunciado anteriormente e considerando o exposto nos incisos acima, a intenção deste produto guia é de orientar Educadores e Professores da Educação Especial descrevendo o processo de como desenvolver/adaptar REA.
Assim, para a presente edição do documento abordaremos três possibilidades de adaptação de material didático, apresentado os recursos que utilizamos e a descrição do processo de transformação, quais sejam:
1. AudioDescrição de materiais didáticos para o público com deficiência visual; 2. Formatação de Texto para o público com baixa visão ou dislexia e 3. Legendagem e Legendagem Descritiva para o público com deficiência auditiva.
Esses três exemplos estão disponíveis neste link em formato ODT (editável) e PDF.
Plataforma REliA. Recursos Educacionais com Licenças Abertas. Instituto Educadigital. Disponível em: https://relia.org.br/reamat/. Acesso em: 14/05/2021.
A pandemia de COVID-19 trouxe inúmeros desafios para professores e alunos, bem como instituições educativas. Um dos temas menos discutidos nesse período foi a crescente adoção de plataformas de tecnologia, particularmente de grandes empresas de software estrangeiras – conhecidas pelo acrônimo GAFAM (Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft) – por instituições e redes de ensino públicas e privadas, do ensino básico ao superior. O projeto Educação Vigiada têm mapeado essa adesão, e demonstra que, em outubro de 2021, 66% de instituições e redes (considerando instituições públicas ensino superior, redes de ensino estaduais e redes municipais com mais de 500 mil habitantes) expõe seus alunos, professores e gestores ao chamado “capitalismo de vigilância”.
Nesse texto, escrito de forma colaborativa ao longo de um semestre por aproximadamente 60 alunos de Pedagogia da Universidade de Brasília (Prof. Tel Amiel, semestre 01/2020) e Universidade do Estado de Minas Gerais (Profa. Janaina Diniz, semestre 02/2020), são discutidos alguns dos principais problemas que surgem na adoção dessas plataformas, no âmbito da educação.
Depoimentos
“A escrita colaborativa do manifesto foi de grande importância para nós estudantes de pedagogia. Esse trabalho permitiu que fossem expostos alguns dos problemas que decorrem da vigilância na educação. Problemas como o controle dos perfis e a venda dos dados dos usuários de plataformas e serviços de grandes empresas de tecnologia podem resultar na perda da autonomia de instituições educacionais e de seus docentes. Além disso, o manifesto também contribuiu com a sugestão de soluções para o problema da vigilância na educação, trazendo ferramentas e recursos baseadas em softwares livres que impedem a coleta e distribuição dos dados dos usuários, em concordância com o papel que a educação deve ter na sociedade. Esse trabalho foi relevante para a nossa formação docente e impactou não só as Universidades envolvidas, mas familiares, amigos e todos ao nosso redor, contribuindo para a conscientização sobre o uso de softwares de forma online e offline, mostrando que existe uma forma segura de utilização dos mesmos.”
Áudio: Relato de Aline Gonçalves de Oliveira, aluna do curso de Pedagogia da Universidade do Estado de Minas Gerais, sobre a produção do manifesto a respeito do problema da vigilância na educação.
Coleta e análise de dados e metadados
No Brasil, como em diversos outros países, grandes empresas de tecnologias, como Google e Microsoft são cada vez mais utilizadas por instituições e redes de ensino por oferecerem pacotes de serviços “gratuitos” à alunos e aos professores. Estes pacotes de serviços são promovidos como plataformas e soluções tecnológicas para educação. A Google oferece o G Suite for Education (que inclui serviços como Gmail, Meet, Classroom, Drive e outros, atualmente Google Worplace for Education) e a Microsoft oferece o serviço o Microsoft 365 (que inclui Word, Powerpoint, Outlook, OneNote, Forms, Teams, dentre outros). No entanto, a gratuidade torna-se apenas uma estratégia por trás de um discurso comercial. Oculta-se, com isso, o real preço desses serviços, ou seja: a coleta de dados e metadados das comunidades educacionais.
Parra¹ define dados e metadados como:
“[…] duas camadas de dados. Uma relativa ao conteúdo de nossa comunicação: as palavras que lemos e escrevemos fornecem um vocabulário que pode se relacionar a objetos e temas de interesse, e seu contexto semântico, passível de ser analisado por sistemas de correlação computacional. Uma segunda camada diz respeito aos metadados, que fornecem informações sobre nossas conexões (de onde acessamos, com quais máquinas ou serviços nos conectamos, o nosso deslocamento físico); sobre nossa rede de interações, nosso grafo (quem interage com quem); sobre padrões de acesso e navegação (duração dos acessos, quais sites e serviços utilizados), características de nossas máquinas (sistema operacional utilizado, softwares instalados), entre outros. […]”
Notamos, pois, que a partir da adesão à serviços para uso dos pacotes educacionais, as instituições de ensino geram e armazenam metadados e dados de usuário, à medida que estes são incluídos ou aderem aos diversos serviços oferecidos (de forma compulsória ou sugerida). Uma análise mais profunda nos leva à conclusão de que empresas de tecnologia de informação, sob o pretexto de utilizarem os dados obtidos com a finalidade de criar novos serviços, melhorar os que já são ofertados e oferecer aos usuários um conteúdo personalizado, utilizam os dados dos usuários, na verdade, para favorecer aos próprios interesses econômicos.
Empresas podem usar as interações dos estudantes em suas plataforma, por exemplo, para coletar dados sobre padrões de comportamento e de consumo que são passíveis de tratamento e podem ser vendidos ou utilizados para efeitos de publicidade direcionada². As empresas possuem grandes interesses nesse tipo de informação, já que têm como parte (maior ou menor) de seus negócios, a venda de propaganda bem como produtos de consumo. Ou seja, ao aderirmos a serviços “gratuitos” revelamos nossos dados pessoais, gostos, interesses, interações, hábitos e comportamentos. Tudo que fazemos quando conectados a estas plataformas transforma-se em dados que são coletados, armazenados e processados. Para além disso, essas plataformas também podem, potencialmente, já que armazenam dados sensíveis, acessar dados de projetos e pesquisas científicas das instituições contratantes (como no caso de pressão de algum Estado). Tal ação traria prejuízos a pesquisadores e instituições de pesquisa no que diz respeito à confidencialidade e possíveis benefícios financeiros ao país.
Como se não bastasse isso, os termos de privacidade da Google para o G Suite for Education, por exemplo, são disponibilizados apenas na língua inglesa, mesmo para contratantes do Brasil, sendo que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) brasileira não admite essa prática³, particularmente em um contexto que envolve crianças:
“as informações sobre o tratamento de dados […] deverão ser fornecidas de maneira simples, clara e acessível, consideradas as características físico-motoras, perceptivas, sensoriais, intelectuais e mentais do usuário, com uso de recursos audiovisuais quando adequado, de forma a proporcionar a informação necessária aos pais ou ao responsável legal e adequada ao entendimento da criança” (BRASIL, 2018)⁴.
As empresas têm termos de uso gerais e termos específicos que devem ser analisados. A Microsoft, além do termo de privacidade geral, possui os que se aplicam a alguns dos serviços compatíveis com seu pacote Microsoft 365 Educação (como os GitHub, LinkedIn Sales Navigator, Azure Stack). A proliferação de termos dificulta a interpretação desses documentos por parte dos usuários. O mesmo ocorre com alguns serviços do pacote G Suite for Education. Afora, existe a dificuldade de interpretação dos termos “dados” e “informação” contidos nestes contratos, como nos apontam Lindh e Nolin (2016, p. 8 apud PARRA et al., 2018, tradução livre⁵):
“[…] por um lado, o Google frequentemente se refere às práticas relativas aos ‘dados do usuário’, ‘dados pessoais’, ‘dados do cliente’, etc. Por outro lado, atribui-se um significado completamente diferente às ‘informações coletadas’, ‘informações que coletamos’ ou ‘informações que você nos fornece’. Essa distinção nunca é esclarecida, pois esses conceitos, embora aparentemente frequentes, nunca são definidos. Isso é crucial, pois esses conceitos desempenham um papel vital na estruturação dos textos das políticas da empresa.”
De igual modo, a Google afirma em sua política de privacidade “que compartilha informações pessoais com empresas, organizações e indivíduos quando tem o consentimento do usuário final ou de seus pais ou responsáveis legais” (p.43)⁶ em caso de estudantes menores de idade. Além de se apresentarem como meras operadoras dos dados dos usuários finais, a Google atua com a permissão das Secretarias de Educação ou instituições de ensino – estas últimas sendo as controladoras desses dados, que deveriam interferir no escopo das informações coletadas e são corresponsáveis pela privacidade dos dados⁷. Com isso, essas plataformas transferem responsabilidades maiores e delegam às escolas a competência de proteger a privacidade de seus alunos.
Predição de comportamento e fake news
A partir de uma análise e tratamento dos dados coletados sobre nossas atividades em aplicativos e sites, empresas que têm como modelo central de negócios a venda de anúncios, como Google e Facebook, podem prever, influenciar comportamentos, além de direcionar o que consumimos. Um exemplo dessa influência são as informações que recebemos através de feeds das redes sociais – sequência de postagens, links e informações que têm a sua distribuição definida por algoritmos não transparentes. A opacidade dos algoritmos permite que as empresas de tecnologia da informação realizem processos obscuros e inacessíveis a sociedade⁸.
Os sistemas algoritmicos se tornaram alvo de atenção pela proliferação das chamadas fake news:”informações falsas, imprecisas e/ou tendenciosas, divulgadas como se fossem notícias reais e podem até acabar com a reputação de uma pessoa ou organização”⁹. As fake news são usadas para prejudicar grupos de pessoas, instituições e até mesmo uma nação através da propagação de mentiras convenientes.
Com a coleta e tratamento de dados, uma porta se abre para que estes sejam organizados para criar perfis e para o disseminação de conteúdos falsos direcionados à públicos-alvo específicos. Os sistemas algoritmicos dos aplicativos selecionam os usuários que receberão os conteúdos. Nessa lógica, nem todos tem acesso a “todas” as informações disponibilizadas na sua rede social. Acessamos mensagens direta ou indiretamente relacionadas ao nosso perfil, definidas anteriormente pelos algoritmos. Esse modelo traz consigo o perigo de vivenciarmos uma realidade unidimensional no mundo online, vivendo em “bolhas” de informação ou desinformação – o que colabora para afetar a nossa visão de mundo e da realidade.
Como exemplo, em meio a pandemia do COVID-19, milhares de notícias falsas foram disseminadas por meio das mídias sociais. Com a intenção de esclarecer a população sobre a falsidade de algumas dessas notícias, a Fiocruz, em parceria com a iniciativa Eu fiscalizo, desmitificou 10 notícias falsas veiculadas sobre a pandemia¹⁰. Nesse sentido, percebemos que a propagação dessas fake news pode afetar muito mais do que a vida online. Pode influenciar diretamente a saúde pública do país.
O desenvolvimento do pensamento crítico é essencial para saber avaliar o que é fato, o que é mentira, e quais as intenções daqueles que criam e disseminam as fake news. Nesse sentido, vale refletir: quais interesses políticos e econômicos estão por trás das fake news?
Fidelização dos usuários
A fidelização de usuário é um processo que ocorre de forma gradual e muitas vezes imperceptível. Aos poucos, vai gerando familiaridade e dependência do “cliente” a determinado produto. Como exemplo, podemos citar a barra de pesquisa Google, que já vem programada como navegador padrão em diversos computadores, smartphones e tablets. Para muitos, não ocorre usar outro navegador ou até mesmo a existência de navegadores diferentes¹¹¹².
Outra forma de fidelização de usuários é a prática do zero rating, realizada em parceria entre operadoras de telefonia e algumas empresas de tecnologia. Consiste em permitir o acesso de forma ilimitada ou sem cobrar o tráfego de dados móveis quando se utiliza de alguns serviços online, como apps de rede sociais e mensagens¹³. Assim, quando expira a franquia do usuário, há acesso livre a apenas alguns aplicativos e serviços (como Facebook, Whatsapp ou Netflix). A prática do zero rating conduz os usuários a utilizarem, muitas vezes, somente estes softwares e plataformas, particularmente os mais pobres, que têm planos pré-pagos ou com menor franquia.
Na contexto educacional existem movimentos na mesma direção. Como afirmou o diretor de educação do Google Brasil ao jornal Estado de São Paulo: “Uma das vantagens de oferecer serviço para escolas é fidelizar o usuário desde cedo”¹⁴. Notamos, então, que ao oferecerem seus serviços de forma “gratuita” para instituições escolares e acadêmicas, essas corporações têm como parte de sua estratégia, que usuários se acostumem com seus serviços e continuem à demandá-los ou utilizá-los no futuro.
A fidelização dos usuários implica, também, uma dependência tecnológica por parte das instituições educacionais. Ao utilizarem estes recursos “gratuitos” na educação – alunos, professores e gestores vão, gradualmente, se habituando com essas ferramentas e serviços. Potencialmente terão menor ímpeto de conhecer, experimentar ou se familiarizar com outras, dado o status institucional desses sistemas.
Essa tendência na educação vai na contra mão do que é previsto na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que destaca em sua competência geral 5°: “Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva”¹⁵.
Há uma tentativa de credibilizar esta tendência de mercado. Muitos acordos firmados fazem uso da imagem de algumas instituições nacionais prestigiadas para autopromoção. Através do discurso de que instituições de renome utilizam suas plataformas, podem atrair outros “clientes” e, ao longo do tempo, vão os fidelizando aos seu software e plataformas. Há uma transferência de credibilidade “[…] quando uma instituição como a Unicamp ou a USP, aderem a um serviço como o GSuite, instituições de menor porte podem identificar nessa ação um aval ou uma garantia. Ao mesmo tempo, a Google poderá apontar à potenciais clientes/parceiros que instituições de renome já aderiram à plataforma, o que certamente reduzirá preocupações de novos e potenciais clientes”¹⁶.
Autonomia tecnológica institucional (redes, escolas), docente e discente
A autonomia tecnológica pode ser definida como a capacidade de produzir e reproduzir tecnologia avançada¹⁷. Essa autonomia é de suma importância para as instituições públicas de educação, e para a comunidade escolar e acadêmica, e é um elemento importante para o desenvolvimento da nação.
A adoção de plataformas das grandes corporações estrangeiras para viabilizar a educação pública compromete a autonomia tecnológica institucional. Com um olhar mais amplo, tendo em vista o alto número de instituições de educação que utilizam plataformas estrangeiras de empresas privadas, a educação pública brasileira se vê em posição submissa com relação as tecnologias de informação fornecidas por empresas estrangeiras.
O uso de plataformas comerciais privadas na educação também interfere na autonomia docente e discente. O processo pedagógico fica submetido às funcionalidades existentes nas plataformas, ou seja, o professor deve adaptar o seu fazer docente aos recursos das plataformas. Recursos estes que não foram desenhados ou desenvolvidos, necessairamente, para atender as necessidades dos docentes ou dos discentes que fazem uso desses recursos. Lembremos que o Brasil é um país com uma grande diversidade cultural e com profundas diferenças sociais e econômicas. Essas questões afetam diretamente o processo pedagógico. Quando apenas duas plataformas passam a viabilizar a educação na maioria das instituições públicas de ensino do país, é claro que as diferenças e diversidades do povo brasileiro não serão consideradas. Além disso, muitas vezes, a escolha dessas plataformas não conta com a participação dos professores e alunos. Elas são impostas pelas secretarias de educação ou reitorias das universidades aos principais usuários dessas tecnologias.
Sobre a autonomia discente, especificamente, ressaltemos que as plataformas da Google e Microsoft são utilizadas também na educação básica, por crianças e adolescentes. Além das implicações sobre a fidelização dos usuários, expostas no item acima, há o comprometimento no desenvolvimento da criticidade do estudante. Freire¹⁸ defende que desenvolvimento da autonomia do sujeito perpassa pela superação da curiosidade ingênua para o alcance da curiosidade epistemológica. Esta última, é preconizada pelo autor como sendo a:
“curiosidade que podemos nos defender de ‘irracionalismos’ decorrentes do ou produzidos por certo excesso de ‘racionalidade’ de nosso tempo altamente tecnologizado. E não vai nesta consideração nenhuma arrancada falsamente humanista de negação da tecnologia e da ciência. Ao contrário, é consideração de quem, de um lado não diviniza a tecnologia, mas, de outro, não a diaboliza. De quem a olha ou mesmo a espreita de forma criticamente curiosa” (p. 33-34).
Ao usar plataformas corporativas desde a infância ou durante toda a formação acadêmica, é possível que o aluno fique suficientemente adaptado à essas ferramentas a ponto de não considerar viável conhecer e usar outras tecnologias. Nesse cenário as tecnologias são usadas de forma acrítica e consequentemente não há a superação da curiosidade ingênua. E se essa superação não acontece, o desenvolvimento da autonomia do sujeito fica comprometida. Vale ressaltar que a fidelização dos usuários realizada pelas plataformas corporativas compromete também a autonomia dos professores e dos alunos.
Outro ponto que devemos destacar é que a precarização das instituições públicas de educação do Brasil, intensificada nos últimos anos, reflete nos contingenciamentos de gastos na educação pública e também nos cortes de investimento público para as áreas de tecnologia de informação. Ao propor uma redução de gastos com a adesão à serviços de empresas estrangeiras, são desconsiderados os custos operacionais e de manutenção, que oneram as instituições de educação de forma permanente¹⁹. A crescente dependência desses sistemas acarreta um desinvestimento em serviços controlados por instituições e governos.
Frisamos que as tecnologias de informação usadas no ensino público devem estar a serviço da educação, e não o contrário.
Venda e compra de dados entre empresas e ‘big data’
Big Data é a análise e a interpretação de grandes volumes de dados de grande variedade. São necessárias soluções específicas para Big Data que permitam aos profissionais de TI trabalharem com informações não-estruturadas comgrande velocidade. Big Data é também definido como uma forma de captar e interpretar dados coletados de usuários, seja essa coleta através de sites, aplicativos ou redes sociais.
Zuboff (p. 18)²⁰, afirma que o Big Data é um rolo compressor tecnológico com “vida própria” e que somos apenas telespectadores desse processo. Para a autora, Big Data é tratado como se fosse um objeto, um efeito ou uma capacidade tecnológica, mas, em sua perspectiva, o Big Data tem uma origem no social e sua consequência é o que ela chama de “capitalismo de vigilância”. Uma segunda perspectiva é a de Mayer-Schönberger e Cukier (p. 13) apresentada no artigo de Antunes e Maia²¹. Para os autores, o Big Data é descrito como “a capacidade da sociedade de aproveitar a informação de formas novas, para obter percepções úteis ou bens e serviços de valor significativo” (p. 03). Segundo a interpretação dos autores, isto coloca em questão a maneira como vivemos e interagimos, utilizando de meios digitais que capturam e processam dados numa escala global, em um universo com informações em um volume de constante crescimento.
Para esclarecer como ocorre o processo de organização dos dados pessoais, Silveiro, Avelino e Souza²² expõem quatro camadas do mercado de dados: “a primeira é a de coleta e armazenamento de dados; a segunda pode ser denominada de processamento e mineração de dados; a terceira é a de análise e de formação de amostras; por fim, a quarta é a de modulação.” (p. 223).
Na modulação, por exemplo, os dados que foram analisados e processados permitem realizar táticas de oferta e venda final de produtos para aquele público especifico. O Big Data é então uma forma de gerar, captar e interpretar dados das pessoas que utilizam as tecnologias de informação e comunicação.
Para notar esse efeito é possível verificar que sites oferecem produtos, informações ou serviços de acordo com nossas pesquisas e comportamentos online. Como exemplo, temos a Amazon que nos recomenda um produto dependendo de padrões de compra e busca; a Google nos apresenta propaganda e recomendações baseadas no seu perfil nos diversos serviços; o Instagram conhece nossos gostos por meios dos perfis curtidos; e o Facebook faz predição de comportamentos. Notamos também efeito do Big Data quando nos são oferecidos serviços que somente pensamos em adquirir, ou quando, nas redes sociais, surgem sugestões de amizades ou produtos, de pessoas ou organizações que acabamos de conhecer. Há um cruzamento de dados a partir daquilo que pesquisamos, com a localização e o aparelho utilizado, por exemplo, e assim, alguma coisa é sugerida, pela qual podemos nos interessar.
Por um lado, empresas podem usar os dados de uma maneira positiva: para melhorar serviços ou garantir a satisfação dos clientes. Entretanto não é apenas isso que acontece. Dados se tornaram importantes bens econômicos que podem ser usados como moeda de troca pelo uso de plataformas, sites e/ou serviços gratuitos, de acordo com Silveiro, Avelino e Souza (p. 220)²³. Como empresas oferecem serviços gratuitos, muitas vezes, elas não obtém receita por meios tradicionais (como pagamento por estes serviços). Sua receita se dá através da venda de dados ou a publicidade segmentada.
A revista The Economist, na publicação de 2017, compara as grandes empresas de tecnologia às petrolíferas, e mostra a valiosidade dos dados coletados online, consideradas como o ‘novo petróleo’. Hoje vemos a relação conflituosa pelo controle e extração de dados quando comparamos um evento histórico como o de 2003, em que tropas americanas e aliadas invadiram o Iraque com o pretexto de proteção a possíveis ameaças ao Kuwait. No entanto, o real interesse estava no petróleo, recurso natural muito valioso. Esse evento pode ser comparado (não na mesma proporção de uma guerra), no contexto do capitalismo de vigilância, com o caso em que a gigante da tecnologia Apple acusou, em 2020, o império das redes sociais, Facebook, de tentar coletar o máximo de dados dos usuários do iPhone. A Apple se posiciona nesse mercado como uma defensora da privacidade, contudo, vale notar que se trata de uma disputa de interesses por modelos de negócios e por quem irá controlar essas informações (TecMundo, 2020). Logo, como no caso do petróleo e as lutas por sua detenção, vemos as tensões instauradas pelo controle dos dados pelas grandes empresas de tecnologia.
Quando nossos dados são coletados e processados por grandes empresas do ramo da tecnologia eles podem ter seu uso terceirizado, com intenção de manipulação ou direcionamento de comportamento individual e coletivo. O documentário Privacidade Hackeada²⁴, de 2019, apresenta esse problema ao retratar a coleta e a monetização dos dados pessoais de milhares de eleitores nas eleições estadunidenses, em 2016. Nesse contexto, o professor David Carroll fez uma requisição de dados que foram acessados de forma indevida pela extinta empresa Cambridge Analytica. A empresa realizou um quiz onde solicitava informações dos usuários e através disso usou uma brecha do Facebook para acessar os dados dos usuários da rede social e traçar o perfil comportamental dos mesmos. Isso foi revelado após processos judiciais contra a extinta empresa, e o presidente da Facebook admitiu a falha no sistema, mostrando ao mundo a vulnerabilidade na qual nossos dados se encontram. O documentário aponta como esses dados foram usados pra indução de comportamento em massa, e como interferiam em algo tão importante, como eleições, em vários países do mundo.
A partir disto, há uma exclamação presente nos produtos digitais oferecidos por essas empresas e em nossos pensamentos que é o free! Até que ponto os aplicativos vinculados à internet são verdadeiramente gratuitos? Cabe questionarmos também sobre produtos que são muito usados por jovens estudantes. Ao aceitarmos o uso gratuito sem entendermos os termos, não sabemos o que essas empresas fazem com nossas informações.
Censura e controle (remoção de conteúdos, contas)
Censura é rejeição que gera remoção de informações retirando conteúdos de circulação. Tudo que seja contrário aos interesses de um Estado, organização ou indivíduo é suprimido com o intuito de impedir a criação de opiniões que sejam opostas às ideias de quem está no poder²⁵. Segundo a Eletronic Frontier Foundation (EFF), organização americana que luta pela liberdade expressão na internet, há diversos casos de censura na rede, como a de jornalistas que publicam escândalos envolvendo políticos, crimes de guerra ou pessoas que militam no movimento negro.
O artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que “todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão”²⁶.
É crucial esclarecer a população sobre a censura na internet. Em se tratando das redes sociais, a prática da censura é ruim porque pode eliminar perfis verdadeiros e conteúdos de usuários, muitas vezes de forma automática pelos sistemas algoritmicos. Para ter censura na internet, há necessidade da vigilância. Assim, quem censura, pode ver e gravar o comportamento dos usuários que fazem uso dos serviços²⁷. A internet é um espaço plural que permite a liberdade de expressão, mas que, no âmbito das grandes plataformas que ditam normas de publicação de forma não transparente, evidenciamos cenários descabidos de censura. Isso se dá quando o usuário não segue as regras das redes – regras que muitas vezes não são transparentes ou claras – ao publicar seu conteúdo. Assim, o conteúdo é removido da plataforma, mesmo que as exigências legais do país sejam maiores que as regras das redes sociais²⁸.
A censura está presente no dia a dia na medida em que conteúdos são removidos das plataformas, ou não são exibidos em nossas timelines. Como exemplo citamos o caso da britânica Kaya Wright que, ao compartilhar uma imagem amamentando seu filho em um grupo fechado do Facebook, teve a foto removida. A empresa alegou que estava “revendo” a imagem por violações de nudez. A página é voltada para maternidade e amamentação e, somente depois de inúmeros protestos de outras mães, a rede social voltou atrás em sua decisão²⁹. Outro caso de censura que podemos citar é a denuncia realizada pelo professor Sérgio Amadeu da Silveira, que possui o canal de podcasts Tecnopolítica. Ele revela a censura feita pelo Youtube ao canal que traz discussões sobre tecnologias, política e vigilância em massa. Segundo Silveira, os conteúdos dos podcasts foram considerados “sensíveis ou chocantes”, mas o Youtube não informa qual ponto ou porque foi identificado dessa forma; o sistema bloqueia ou reduz as visualizações dos podcasts. Nos casos exemplificados os algoritmos retiram os conteúdos sem maiores explicações, impedindo a circulação de informações verdadeiras e úteis para sociedade. Por outro lado, temos canais de extrema direita e divulgadores de desinformação que cresceram consideravelmente no youtube, nas eleições de 2018. O impulsionamento do sistema algoritmo da plataforma foram determinantes para o crescimento desses canais, como revela a pesquisa realizada pelo Intercept e pelo Manual do Usuário³⁰.
Mais recentemente, assistimos o Twitter e o Facebook desativarem as contas do, até então, presidente dos Estados Unidos Donald Trump, com a alegação de incitação à violência pelo dirigente. Outro caso recente de censura das redes sociais ocorreu em fevereiro de 2021. Em um contexto de protestos de agricultores da Índia, 250 perfis de organizações camponesas tiveram suas contas removidas pelo Twitter³¹. Os parâmetros utilizados pelas empresas de tecnologia não são claros, mas é perceptível que a censura realizada pelos oligopólios de tecnologia não tem, muitas vezes, a intenção de resguardar a democracia ou combater o fascismo. Muitas dessas práticas de censura se dá contra aqueles que vão contra os interesses políticos e econômicos dessas empresas de tecnologia.
Portanto, acreditamos ser de suma importância que a população seja esclarecida sobre a censura praticada pelas grandes empresas de tecnologia. Com o olhar para a educação, achamos ser primordial que a população não aceite a censura. Censura lesa o aprendizado, restringe e controla o acesso à informação e fere a liberdade de expressão de várias pessoas que estão inseridas em um ensino devastado por um governo que visa bloquear ou até mesmo reduzir as informações necessárias para a formação crítica da população.
Concentração de poder em poucas empresas (GAFAM)
Empresas que constituem um oligopólio tecnológico – a GAFAM (Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft) – vão muito além da ideia de corporações que simplesmente detêm grande fatia do mercado³². Elas “fagocitam” todas as possibilidades de inovação e criação por parte de outras empresas menores e/ou pessoas, restringindo a concorrência, copiando e inibindo o surgimento de novos produtos e serviços. Além disso, elas se beneficiam com a captura e armazenagem de dados de seus usuários. Apesar de parecer uma benfeitoria, muitas vezes, essas empresas oferecem serviços com a falsa ideia de serem gratuitos para nós, usuários. Na realidade essa é uma estratégia comercial utilizada por essas empresas para nos aprisionar aos seus hardwares, softwares e plataformas. Desta forma, quando aderimos a esses “ecossistemas” somos direcionados a acreditar que eles são únicos e insubstituíveis.
Observamos também como estas empresas, mesmo diante de um período de recessão econômica, lucram com a pandemia. Como aborda a reportagem realizada pelo site UOL (2020):
“Amazon, Facebook e Apple anunciam números robustos no segundo trimestre, superando positivamente as estimativas do mercado em meio à pandemia de Covid-19. Amazon chegou a dobrar seu lucro líquido no período. Desafiando a crise generalizada provocada pela pandemia de coronavírus que tem pressionado milhares de empresas, gigantes da tecnologia exibiram ontem resultados trimestrais que superaram positivamente as expectativas de analistas”³³.
Os lucros impressionam e levantam a questão de um enriquecimento e fortalecimento dos oligopólios tecnológicos advindos da extração de dados dos usuários, tanto para uso comercial ou para aperfeiçoamento de seus sistemas.
Um dos setores que atualmente se tornou dependente das corporações de tecnologia da informação foi a educação. Para termos acesso ao ensino público, dentro do atual contexto pandêmico, passamos pelas “mãos” da GAFAM. É quase obrigatório a utilização de alguma plataforma disponibilizada por estas empresas, para que seja viabilizado o processo de ensino e aprendizagem.
A comodidade, a falta de recursos das instituições de ensino ou a simples “desculpa” da facilidade e gratuidade dos serviços oferecidos pela GAFAM torna a adesão a esses ecossistemas um processo quase que automático, o que contribui para limitar a possibilidade de avaliação e de uso de outras possibilidades tecnológicas.
Até mesmo quando uma pessoa tenta se desprender dessas empresas para utilizar outras soluções, esbarra em barreiras criadas pela GAFAM, como o zero rating, para que o usuário retorne aos seus serviços. Um bom exemplo que temos sobre essa questão, e que também ilustra o poder econômico dessas empresas, é o lançamento de serviços de internet pela Google. A internet, cada vez mais, torna-se uma necessidade/direito básico na vida do ser humano, até mesmo para exercer sua cidadania. Agora, com o serviços internet da Google há mais um mecanismo centralizado para conexão à rede mundial de computadores. Portanto, com a aprimoramento desse sistema, a Google poderá dominar o cenário da internet e passar a valer-se de suas estratégias para minar outras possibilidades, sob o risco de se consolidar como um meio privilegiado para acessar à internet.
Não existem diagnósticos exatos no que diz respeito aos impactos dessas plataformas na educação, tornando ainda mais incerto esse caminho, onde ferramentas e programas podem ameaçar a independência pedagógica e os dados de alunos e professores. É indispensável que nós, alunos e professores, conheçamos saídas aos oligopólios tecnológicos, de forma que a educação seja verdadeiramente livre e para todos.
Há saídas? Algumas considerações
Finalmente, todas essas informações nos permitem compreender a gravidade do problema e os desafios nas esferas tecnológica, política e econômica enfrentados pela educação pública. Os problemas discutidos aqui estão interligados: coleta e análise de dados, venda e compra de dados e big data, predição de comportamento e fake news, fidelização de usuários, zero rating, comprometimento da autonomia tecnológica, censura e, por fim, concentração de poder dos oligopólios de tecnologia. Existem caminhos para minimizar o capitalismo de vigilância na educação. Tais caminhos ou saídas perpassam pelas esferas política, econômica e educacional, enfim, por investimentos econômico e tecnológico na educação e pela formação dos educadores e educandos, bem como de toda a sociedade.
Um dos caminhos que apontamos é o investimento por parte do Estado (municipal, estadual e federal) na criação e no aperfeiçoamento de infraestruturas tecnológicas e de softwares livres para as instituições públicas de ensino. Os softwares livres, são importantes alternativas aos softwares privados, pois concedem liberdades aos usuários e permitem acesso e alteração do seu código-fonte. Ressaltamos que software livre não é sinônimo de software gratuito (mas muitos são). Para um software ser considerado livre, ele deve garantir quatro “liberdades” ao usuário: 1) a liberdade de executar o programa como desejar; 2) de estudar como o programa funciona; 3) de redistribuir cópias do mesmo; e 4) distribuir cópias de versões modificadas do programa³⁵.
A pesquisadora Karina Menezes³⁶ também defende que uma das soluções para alcançar a autonomia institucional é optar por software livre, que é uma escolha ética e portanto uma escolha política, pensando no desenvolvimento com o investimento econômico cultural para fomentar e manter um ecossistema sustentável e inovador de produção tecnológica com software livre “isso deveria ser foco de investimento do Estado fazendo parcerias públicas/privadas em várias áreas com o intuito de preservar nossa soberania tecnológica dos dados das instituições que é um direito fundamental que deveria ser resguardado e preservado pelo nosso governo”.
Nesse sentido, também apontamos como uma das saídas para essa problemática a migração de servidores que possuem o código-fonte fechado para possibilidades seguras – com o código aberto – que possuem garantia de proteção de dados. Algumas plataformas e softwares livres oferecem serviços gratuitos. Como exemplo, podemos citar os sistemas operacionais GNU/Linux, a plataforma Nextcloud e software LibreOffice. Dessa forma, as universidades e escolas podem adotar essas alternativas, para manter a privacidade e a segurança de dados dos alunos e funcionários (mais informações no site do Escolha Livre).
Neste aspecto, é necessário deixarmos de ser uma colônia digital, muito bem colocado pelo professor Sérgio Amadeu da Silveira. Sem os devidos investimentos em tecnologias próprias, continuaremos perdendo autonomia – submissos às corporações estrangeiras de tecnologia da informação. A construção de uma soberania tecnológica se faz necessária para que possamos reduzir a exploração comercial dos nossos dados e ter maior independência. As próprias instituições de ensino deveriam gerenciar os dados de seus usuários, sem controle de empresas privadas. Em síntese, o desenvolvimento público-democrático de tecnologias de informação para a educação, a exemplo de softwares livres, seria a base para a independência das instituições de ensino, algo de extrema importância para se pensar e se implementar, o mais rápido possível.
Outra possibilidade para enfrentar o problema é a implantação de leis eficientes de proteção de dados pessoais para que as grandes empresas sejam responsabilizadas no caso de abusar de seu poder, poder esse advindo da posse de dados dos cidadãos. Em 2020, entrou em vigor no Brasil a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)³⁷ – Lei 13.709/2018. A referida Lei deve ser compreendida e cumprida pelos gestores da educação pública. No entanto, a regulamentação dos oligopólios de tecnologias é um desafio, pois são empresas que estão acima das legislações dos países nos quais atuam.
Ações mais pontuais também devem ser realizadas por nós, professores. Devemos conscientizar nossos alunos de que proteção de dados não é apenas questão de privacidade, mas em muitos casos a proteção à vida. Como educadores, devemos ensinar: sobre prevenção à desinformação; práticas para proteção de dados; como funcionam os sistemas algoritmicos de timeline; soluções livres e abertas; quais são os problemas que podem ocorrer com propagação de notícias falsas e sobre a importância da ética no ciberespaço.
É essencial que, como educadores, saibamos os melhores caminhos para prevenir e combater tanto a predição de comportamento quanto a desinformação. O papel do professor é conscientizar os alunos sobre os riscos no uso das plataformas corporativas e denunciar todos os tipos de controle, monitoramento e vigilância exercidos por elas. Orientar, trazer informações sobre os recursos que existem, como exemplo, o Jitsi (videoconferência), o Etherpad (escrita colaborativa), entre outros. Devemos também ensinar como utilizar e fomentar a curiosidade sobre plataformas e soluções livres e abertas.
A baixa divulgação de saídas livres e abertas, é um dos aspectos que contribui para que os usuários sejam reféns desses oligopólios tecnológicos. Percebemos ser necessária a discussão e aplicação do ensino do uso crítico e consciente das tecnologias. É preciso levar as pessoas a reflexão, antes de instalarem e recomendarem aplicativos e serviços na internet, incentivar o uso de softwares livres, para potencializar o desenvolvimento de novas possibilidades e almejar uma sociedade mais crítica e reflexiva sobre o uso das tecnologias de informação. Para além disso, é importante termos clareza que a saída não é individual, ela é coletiva. Por isso é essencial nos organizarmos para enfrentar esse problema.
Não podemos consentir que a educação seja fonte de negócios, renda e lucro para as grandes empresas tecnológicas internacionais. É necessário mobilização das instituições educacionais para pressionar governos a possibilitar o desenvolvimento das nossas próprias tecnologias, através de políticas e investimentos. A educação pública não pode se tornar um modelo de educação padronizado e privatizado.
Referências
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Pesquisa feita aponta uma forte associação entre universidades públicas de países da América do Sul e as empresas Google e Microsoft
Dados preliminares de pesquisa inédita do projeto Educação Vigiada, realizada pela Iniciativa Educação Aberta em parceria com a Rede Lavits apontam que, na Colômbia, de 75 universidades públicas pesquisadas, somente 4 (5%) tem seus serviços institucionais de e-mails hospedados em servidores que não são da Google (65%) ou da Microsoft (30%).
Na Venezuela, dentre as 23 universidades públicas pesquisadas, 10 (44%) hospedam seu serviço de e-mail em servidores da Google e 12 (52%) hospedam em servidores próprios ou de outras empresas (os dados de 1 universidade ainda precisam ser investigados com maior detalhamento).
Já no Uruguai, os dados apontam em outra direção: a predominância de alternativas aos servidores das empresas Google e Microsoft. Do total de 29 universidades públicas uruguaias pesquisadas, 83% utilizam servidores próprios ou de outras empresas para hospedar seus serviços de e-mail, e somente 17% (5, no total) utilizam servidores da Google.
O projeto tem como objetivo mapear os acordos entre todas as instituições de educação superior públicas da América do Sul e empresas associadas ao capitalismo de vigilância. A pesquisa buscou investigar se há a transferência do serviço de gerenciamento de e-mails para as empresas Google e Microsoft em instituições de ensino superior públicas sul-americanas. Por meio do uso de um script foi possível consultar quais servidores são responsáveis por gerenciar o tráfego de e-mail para um domínio específico, para saber se estavam sendo hospedados pela Google e Microsoft ou pelas próprias instituições. A relação entre servidores de e-mail e mudança de outros serviços (como o uso de GSuite for Education ou Microsoft 365) foi validada na primeira parte do estudo através de pedidos via Lei de Acesso a Informação.
Em 2019, na sua primeira etapa e com apoio da Fundação Derechos Digitales, a pesquisa publicou dados sobre o Brasil. Em 2021, com apoio da Rede Lavits a pesquisa está expandindo para analisar outros países da América do Sul. Em breve os dados completos por país serão disponibilizados.
Contexto
Nos últimos anos, houve no Brasil um crescimento na oferta de plataformas educacionais à instituições públicas de ensino e de pesquisa por parte de grandes empresas do setor de tecnologia, particularmente Google e Microsoft. Durante esse tempo foram ofertados serviços e produtos gratuitos a instituições e entes públicos. Essas adesões, em grande parte, têm como contrapartidas a coleta, tratamento, utilização e (potencialmente) a comercialização de dados dos seus usuários. Esse processo se consolidou e se expandiu devido às restrições de deslocamento e funcionamento de serviços presenciais durante a pandemia de Covid-19, com a implementação de modelos remotos de ensino e de trabalho.
No campo da educação superior pública, a adoção de serviços e produtos de empresas privadas como soluções oficiais leva a uma diminuição e precarização dos departamentos responsáveis pela implementação e manutenção da infraestrutura da universidade. Esse movimento, motivado em grande parte pela necessidade de corte de gastos e ações emergenciais, torna as universidades dependentes dessas empresas a longo prazo pelo fato de que os seus setores são diminuídos, e seus poucos servidores não conseguirão atender as demandas da instituição. Um dos exemplos de adoção de soluções de empresas privadas por instituições públicas é a entrega do serviço de comunicação via e-mail das universidades para empresas que monetizam os dados de seus clientes. Essa decisão implica na perda de autonomia da universidade, pela terceirização da responsabilidade de transmissão e hospedagem de informações sensíveis, que podem ficar sujeitas a comercialização.
O projeto Educação Vigiada reúne professores e pesquisadores do Brasil, Colômbia, Uruguai e Bolívia para realizar a etapa sul-americana da pesquisa. O grupo é formado pelos professores Leonardo Cruz (UFPA), Tel Amiel (UnB) e Filipe Saraiva (UFPA), e pelos pesquisadores María Viola Deambrosis (Universidad de la República), Sebastian Zapateiro (FUTCO – Colômbia), Dariana Astrid Salas Luna (FUTCO – Colômbia), Eloisa Larrea Montaño (Internet Bolívia) e André Castanheira Oddone (UnB).
Research shows a strong association between public higher education institutions in South American countries and Google/Microsoft
Preliminary data from a new study under the Education Under Surveillance project, conducted by the Open Education Initiative in partnership with Lavits Network, shows that in Colombia, out of 75 public higher education institutions (HEIs) studied, only 4 (5%) have their institutional email services hosted on servers that are not Google’s (65%) or Microsoft’s (30%).
In Venezuela, among the 23 public HEIs investigated, 10 (44%) host their email service on Google servers and 12 (52%) host it on their own or other companies’ servers (the data from 1 university is being investigated in more detail).
In Uruguay, the data points in a diffrerent direction: the predominance of alternatives to Google and Microsoft servers. From the total of 29 public Uruguayan HEIs studied, 83% use their own or other companies’ servers to host their email services, and only 17% (5 in total) use Google’s servers.
The project aims to map the agreements between public HEIs in South America and companies associated with surveillance capitalism. The research seeks to investigate if there is a transfer of email management services to Google and Microsoft in South American public higher education institutions. Through the use of a script it was possible to query which servers are responsible for managing email traffic for a specific domain, to find out whether they were being hosted by Google, Microsoft or by the institutions themselves. The relationship between email servers and change of other services (such as the use of Google Workspace for Education or Microsoft 365) was validated in the first part of the study through requests based on the Brazilian Access to Information Law.
In 2019, in its first stage, and with support from Fundación Derechos Digitales, the research published data about Brazil. In 2021, with the support of the Lavits Network, the research is expanding to analyze other countries in South America. Complete data by country will soon be available.
Background
In recent years there has been a growth in Brazil in the provision of private educational platforms to public education and research institutions by large technology companies, particularly Google and Microsoft. During this time ‘free’ services and products have been offered to public institutions. These agreements, in large part, have as their counterpart the collection, processing, use, and (potentially) commercialization of data from their users by these companies. This process has been consolidated and has expanded due to the restrictions of travel and face to face activities during the Covid-19 pandemic, with the implementation of remote teaching and work models.
In the field of public higher education, the adoption of services and products from private companies as official solutions leads to a shrinking and precariousness of the departments that are responsible for implementing and maintaining HEIs’ information and communication technology infrastructure. This movement, motivated in large part by the need to cut costs and current emergency actions, makes HEIs dependent on these companies in the long run because their IT sectors might be reduced, and their few employees will likely not be able to meet the demands of the institution.
One example is the adoption of private companies’ solutions by public institutions is signing of HEIs’ email communication service to companies that monetize their customers’ data. This decision implies the loss of the institution’s autonomy by outsourcing the responsibility of transmission and hosting of sensitive information, which may be subject to commercialization.
The Education Under Surveillance project brings together teachers and researchers from Brazil, Colombia, Uruguay, and Bolivia to carry out the South American stage of the research. The group is formed by professors Leonardo Cruz (UFPA), Tel Amiel (UnB), and Filipe Saraiva (UFPA), and researchers María Viola Deambrosis (Universidad de la Republica), Sebastian Zapateiro (FUTCO – Colombia), Dariana Astrid Salas Luna (FUTCO – Colombia), Eloisa Larrea Montaño (Internet Bolivia), and André Castanheira Oddone (UnB).
Investigación indica una fuerte asociación entre las instituciones públicas de educación superior de los países de Sudamérica y las empresas Google y Microsoft
Los datos preliminares de la investigación inédita del proyecto Educación Vigilada, realizada por la iniciativa de Educación Abierta en colaboración con la Red Lavits, indican que en Colombia, de las 75 instituciones públicas de educación superior investigadas, sólo 4 (5%) tienen sus servicios de correo electrónico institucional alojados en servidores que no son de Google (65%) y de Microsoft (30%).
En Venezuela, entre las 23 instituciones públicas encuestadas, 10 (44%) alojan su servicio de correo electrónico en los servidores de Google y 12 (52%) lo hacen en sus propios servidores o en los de otras empresas (los datos de 1 universidad están pendientes).
En Uruguay, los datos apuntan en otra dirección: el predominio de alternativas a los servidores de las empresas Google y Microsoft. Del total de 29 instituciones públicas de educación superior uruguayas encuestadas, 83% utilizan servidores propios o de otras empresas para alojar sus servicios de correo electrónico, y sólo 17% (5, en total) utilizan servidores de Google.
El proyecto tiene como objetivo mapear los acuerdos entre todas las instituciones públicas de educación superior de América del Sur y las empresas asociadas al capitalismo de vigilancia. La investigación buscó investigar si existe la transferencia del servicio de gestión de correo electrónico a las empresas Google y Microsoft en las instituciones de educación superior públicas de América del Sur. Mediante el uso de un script fue posible consultar qué servidores son los responsables de gestionar el tráfico de correo electrónico de un dominio determinado, para saber si estaban siendo alojados por Google y Microsoft o por las propias instituciones. La relación entre los servidores de correo electrónico y el cambio en otros servicios (como el uso de Google Workspace for Education o Microsoft 365) se validó en la primera parte del estudio a través de las solicitudes realizadas con base en la Ley de Acceso a la Información de Brasil.
En 2019, en su primera etapa y con el apoyo de la Fundación Derechos Digitales, la investigación publicó datos sobre Brasil. En 2021, con el apoyo de la Red Lavits, la investigación se amplía para analizar otros países de Sudamérica. Próximamente estarán disponibles los datos completos por países.
Antecedentes
En los últimos años ha crecido en Brasil la provisión de plataformas educativas a instituciones públicas de educación e investigación por parte de grandes empresas del sector tecnológico, especialmente Google y Microsoft. Durante este tiempo, se ofrecieron servicios y productos gratuitos a las instituciones y entidades públicas. Estas suscripciones, en gran medida, tienen como contrapartida la recogida, el tratamiento, el uso y (potencialmente) la comercialización de los datos de los usuarios. Este proceso se consolidó y amplió debido a las restricciones de desplazamiento y funcionamiento de los servicios presenciales durante la pandemia de Covid-19, con la implantación de modelos de enseñanza y trabajo a distancia.
En el ámbito de la educación superior pública, la adopción de servicios y productos de empresas privadas como soluciones oficiales conlleva una disminución y precarización de los departamentos encargados de la implantación y mantenimiento de la infraestructura institucional. Este movimiento, motivado en gran medida por la necesidad de recortar gastos y las acciones de emergencia, hace que las instituciones dependan de estas empresas a largo plazo, ya que sus departamentos se ven mermados y sus pocos servidores no podrán satisfacer sus demandas. Uno de los ejemplos de adopción de soluciones de empresas privadas por parte de instituciones públicas es la cesión de su servicio de comunicación por correo electrónico a empresas que monetizan los datos de sus clientes. Esta decisión implica la pérdida de autonomía de la institución, al externalizar la responsabilidad de transmisión y alojamiento de información sensible, que puede ser objeto de comercialización.
El proyecto Educación Vigilada reúne a profesores e investigadores de Brasil, Colombia, Uruguay y Bolivia para llevar a cabo la fase sudamericana de la investigación. El grupo está formado por los profesores Leonardo Cruz (UFPA), Tel Amiel (UnB) y Filipe Saraiva (UFPA), y los investigadores María Viola Deambrosis (Universidad de la República), Sebastian Zapateiro (FUTCO – Colombia), Dariana Astrid Salas Luna (FUTCO – Colombia), Eloisa Larrea Montaño (Internet Bolivia) y André Castanheira Oddone (UnB).
Evento abordará a importância do software livre e dos REA para educação, com lançamento de três novos projetos da Iniciativa Educação Aberta
Com o objetivo de auxiliar professores e gestores em tempos de pandemia, e promover a importância do software livre e dos recursos abertos na educação, a Iniciativa Educação Aberta realizará um webinário dia 24 de novembro as 16h30, no canal do Instituto Educadigital no Youtube. Também serão lançados três projetos realizados pela Iniciativa Educação Aberta, com apoio da UNESCO Brasil:
Escolha Livre – um site criado para apresentar diferentes opções de sistemas e software livre, bem como recursos educacionais abertos para professores e gestores;
Mapa de Serviços Abertos – o mapa permite cadastro e exibe prestadores de serviços voltados para a educação, que tenham, em seu portfólio, soluções baseadas em software livre e/ou recursos educacionais abertos;
Comunica! – é um servidor dedicado para educadores experimentarem serviços com base em software livre, para videoconferência, para chat de voz e texto, e para escrita colaborativa.
Participarão da live: Rebeca Otero, coordenadora de Educação da UNESCO no Brasil; Tel Amiel, coordenador da Cátedra UNESCO em Educação a Distância na Universidade de Brasília; Ka Menezes, docente da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia e membro do Raul Hacker Club; Carlinhos Ceccocni, gerente de assessoria técnica da secretaria executiva do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br); e Marlucia Amaral, assessora técnica na chefia de gabinete da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo.
Novo levantamento mostra que 1/3 das secretarias de educação de cidades com mais de 500 mil habitantes expoẽm dados pessoais de crianças e adolescentes ao capitalismo de vigilância
Levantamento inédito do projeto Educação Vigiada mostra que 15 das 51 redes municipais de ensino de cidades com mais de 500 mil habitantes estão expondo seus estudantes — crianças e adolescentes — ao chamado “capitalismo de vigilância”, ou seja, adotam serviços e plataformas de grandes empresas de tecnologia cujo modelo de negócio é baseado na ampla extração de dados.
Cunhado pela pesquisadora e professora da Universidade de Harvard, Shoshana Zuboff, em seu livro The Age of Surveillance Capitalism (A Era do Capitalismo de Vigilância), o termo vem sendo aplicado às BigTechs como Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft, conhecidas pelo acrônimo GAFAM. “Esse novo levantamento deve causar um alerta, pois as redes municipais atendem alunos da educação infantil e do ensino fundamental, o que demanda atenção especial à privacidade de dados de crianças e adolescentes”, ressalta o professor Leonardo Cruz, responsável pelo novo levantamento.
Com a crescente e contínua digitalização da vida cotidiana por meio de programas de computador, aplicativos de celular, sites e redes sociais, grande parte das atividades humanas são agora mediadas por algum dispositivos computacional. Tais dispositivos são capazes de coletar desde dados a partir do que compartilhamos (fotos, vídeos, mensagens, etc.) bem como metadados, ou seja, dados que compartilhamos indiretamente — sites que visitamos, geolocalização, cliques, curtidas, comportamento on-line etc. A partir desses dados, algoritmos de Inteligência Artificial vão sendo treinados para criar perfis, predizer comportamentos, definir o que vemos e até para nos servir propaganda.
O Educação Vigiada é um projeto de divulgação científica da Iniciativa Educação Aberta, com base em uma pesquisa que vem sendo realizada desde 2018 por um grupo de pesquisadores da UnB e da UFPA, sobre a crescente presença de grandes empresas como a Google e Microsoft no cenário da educação pública brasileira. Lançado em março de 2020, revelou que 75% das instituições públicas de ensino superior e secretarias estaduais de educação estão expostas ao “capitalismo de vigilância” ao aderirem a termos e condições de serviços robustos de empresas privadas, desde contas de email a ferramentas de uso remoto. O novo mapeamento apresentado em novembro de 2020 alcançou também as redes municipais de educação e igualmente visa chamar a atenção dos gestores da educação para o problema da privacidade, vigilância e segurança de dados, agora destacando que os envolvidos são crianças e adolescentes.
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, em vigor desde 18 de setembro de 2020, traz em seu Artigo 14 o destaque para a prioridade absoluta de crianças e adolescentes, reforçando o que já estava previsto em outros arcabouços jurídicos, tais como a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Por ofertarem serviços de maneira “gratuita” para as redes públicas, gestores e departamentos jurídicos das redes educacionais não exigem transparência em relação ao tratamento de dados. Tratamento esse que que pode incluir mineração desde informações sensíveis até dados relacionados a atuação e desempenho pedagógicos, processamento de material didático e científico, dentro outros. Gestores simplesmente dão aceite a termos de uso e políticas de privacidade elaborados somente pelas empresas. Relatório da Iniciativa Educação Aberta e do Instituto Alana analisou os termos de uso de serviços voltados para área educacional das empresas Google e Microsoft e apontou diversas dúvidas sobre como e quais dados são coletados e tratados, e de quem é a responsabilidade sobre a privacidade dos dados dos usuários.
O projeto Educação Vigiada faz parte da Iniciativa Educação Aberta (parceria entre a Cátedra UNESCO de Educação a Distância (UnB) e o Instituto EducaDigital) em parceria com o Laboratório Amazônico de Estudos Sociotécnicos e o Centro de Competência em Software Livre — ambos da UFPA.
Formado em audiovisual pela Escola de Comunicações e Artes da USP, Thiago Mahrenholz
criou uma série de vídeos baseada no no livro Big Tech, de Evgeny Morozov, escritor bielorrusso e um dos mais influentes especialistas em tecnologia e em internet do mundo. Formada por 8 vídeos, licenciados em Creative Commons, a série apresenta conceitos básicos sobre a relação entre tecnologia e política, algoritmos, vigilância estatal e direito à privacidade, para introduzir mais pessoas à discussão digital.
Resumo do livro publicado em portugués pela UBU Editora O livro problematiza a lógica do chamado “solucionismo” tecnológico, que enxerga a tecnologia como panaceia para problemas que instituições falharam em resolver. Trata-se de um alerta sobre o funcionamento da internet e de plataformas tecnológicas baseadas em dados pessoais (por exemplo, Airbnb, Uber, Facebook e WhatsApp). Diferente do que se costuma acreditar, podem servir de ferramenta contrária à democracia, dependendo da maneira como são usadas.
Lista de episódios
BIG TECH #1: Introdução Podemos apostar nas gigantes empresas de tecnologia como solução para os problemas históricos da humanidade?
BIG TECH #5: A vigilância Como se proteger da vigilância do Estado? E quais os problemas em negociar nossos dados pessoais em troca de produtos gratuitos?
BIG TECH #6: Pós-capitalismo Com as novas ferramentas tecnológicas, estamos em transição para uma sociedade mais justa?
BIG TECH #7: Tendências Você conhece os conceitos de extrativismo de dados, mediação digital, consenso algorítmico, emancipação predatória e tecnoutopia?
BIG TECH #8: Saídas Quais os desafios para construir uma internet livre e soberana?
O Seminário Internacional REA foi um sucesso de público e de interação online. Quem não pode acompanhar ou deseja rever alguma parte do evento, disponibilizamos uma playlist da gravação realizada pela equipe da Deputada Jandira Feghali.
No término do evento convidamos todos a contribuir para uma carta direcionada ao Ministro da Educação, e também, aos presidentes da Comissão de Cultura e de Educação.
E por último, estamos mapeando tudo o que saiu na mídia sobre o evento, se você quiser colaborar pode nos enviar o link que encontrar pelos comentários ou pelas nossas redes sociais. Até o momento temos: