Educação aberta e recursos educacionais abertos na política pública brasileira

Publicado originalmente em Digital Rights CC-BY-SA

Por Priscila Gonsales*

Toda e qualquer forma de educar envolve um processo de comunicação e esse, por sua vez, quase sempre relacionado à disseminação de informações. Porém, o modo como produzimos, consumimos e compartilhamos informação na atual sociedade digital é muito diferente do que era há pouco mais de 20 anos.

Após a revolução industrial, a informação era prioritariamente física, impressa: livros, discos, CDs, apostilas, enciclopédias, dentre outros instrumentos. Com o surgimento da internet, a informação não requer mais materialidade, pode ser transmitida, multiplicada, copiada, distribuída, remixada, enfim, alterada de maneira imediata e ilimitada conforme variados contextos e necessidades específicas.

Se hoje encontrar dados, conteúdos e materiais está ao alcance de um clique, naturalmente a educação deveria se beneficiar desse potencial e passar a usar, criar e compartilhar recursos pedagógicos disponíveis online, aprimorando as habilidades de pesquisa, colaboração e autoria de professores e alunos. Mas, infelizmente essa é uma realidade ainda distante.

Anualmente, uma quantidade imensa de dinheiro público (da ordem de milhões) são gastos pelo governo brasileiro na compra de materiais didáticos impressos e digitais que não são recursos educacionais abertos (REA) e, portanto, têm de acesso restrito, inibindo as possibilidades de reprodução, criação e adaptação por educadores e estudantes.

Por definição oficial divulgada em documento da Unesco/Commonwealth, REA são materiais de ensino, aprendizado e pesquisa, fixados em qualquer suporte ou mídia, preferencialmente em plataformas ou formatos livres (software livre), que estejam sob domínio público ou licenciados de maneira aberta, permitindo que sejam utilizados ou adaptados por terceiros.

Recursos Educacionais Abertos podem incluir cursos completos, partes de cursos, módulos, livros didáticos, artigos de pesquisa, vídeos, testes, software, e qualquer outra ferramenta, material ou técnica que possa apoiar o acesso ao conhecimento. Tal definição data de 2011 e foi redigida com ajuda da Comunidade Recursos Educacionais Abertos (REA) do Brasil.

Desde 2008, a Comunidade REA do Brasil, formada por centenas de pessoas das mais diversas áreas do conhecimento, vem organizando eventos, encontros e publicações sobre a importância da educação aberta. Atuando junto à Comunidade REA, o projeto REA.br, coordenado pelo Instituto Educadigital, com apoio da Open Society Foundations faz um trabalho de advocacy para transformar a política pública de acesso a recursos educacionais financiados com orçamento público. Vencedor do Prêmio ARede 2014, o REA.br atua nas esferas legislativa e executiva, além de participar periodicamente de encontros internacionais, como o Congresso Mundial de REA, organizado pela Unesco em 2012.

Alguns resultados desse trabalho de advocacy nos últimos anos:
Plano Nacional de Educação (PNE): duas metas (5 e 7) sobre qualidade na educação básica contemplam o incentivo a REA;
Projeto de Lei Federal 1513/2011: visa garantir que as compras públicas ou contratação de serviços e materiais educacionais sejam regidas por meio de licenças livres, permitindo a difusão e a ampliação do acesso a esses bens por toda a sociedade;
Projetos de Lei Estadual em SP (989/2011): aprovado por unanimidade pela Assembleia Legislativa de São Paulo, mas vetada pelo governador Alckmin;
Projetos de Lei Estadual do PR (185/2014) e do DF (1832/2014) em tramitação;
Decreto municipal em São Paulo (52.681/ 2011), que dispõe sobre o licenciamento obrigatório das obras intelectuais produzidas ou subsidiadas com objetivos educacionais, pedagógicos e afins.

Em novembro de 2014, na capital estadunidense de Washington, durante a OpenEd – o maior congresso mundial de educação aberta – o Instituto Educadigital e outras organizações de vários países participaram de uma atividade de advocacy de REA diretamente com políticos e assessores técnicos na Casa Branca. O objetivo era destacar os benefícios da atual política pública do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em relação a REA, para que seja mantida e ampliada aos demais níveis de ensino. Além disso, o grupo ressaltou a importância de essa experiência ser compartilhada com governos de outros países por meio de congressos e seminários.

A partir dessa vivência, o Instituto Educadigital conseguiu articular com as comissões de educação e cultura da Câmara dos Deputados, em Brasília, para organizar um seminário sobre o tema, trazendo convidados internacionais para compartilhar suas experiências em política pública de REA. Vai ser no dia 19 de agosto, em Brasília, e dia 20 de agosto, em São Paulo, organizado em parceria com a ARede.educa.

Para saber mais sobre iniciativas brasileiras e internacionais sobre REA, consulte o site: www.rea.net.br.

*Priscila Gonsales é educadora e jornalista, empreendedora social Ashoka, fundadora do Instituto Educadigital, que desenvolve iniciativas e projetos de educação aberta na cultura digital.
prigon@educadigital.org.br

Imagem destaque: (CC BY-SA) OpenSource.com

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