Direito Autoral e Educação Aberta e a Distância: Perguntas e Respostas

A Iniciativa Educação Aberta publica o Guia Direito Autoral e Educação Aberta e a Distância Perguntas e Respostas para educadores e instituições de ensino. O Guia apresenta perguntas e respostas a uma série de preocupações relacionadas ao uso, produção e publicação de recursos educacionais que se tornaram urgentes em tempos de pandemia. Na medida em que cresce o uso de sistemas institucionais e plataformas externas para interação e publicação de conteúdo, a preocupação com os direitos autorais se torna central.

O Guia foi criado pelo Prof. Dr. Allan Rocha de Souza (UFFRJ/ITR | UFRJ/PPED) do Núcleo de Pesquisa em Direitos Fundamentais, Relações Privadas e Políticas Públicas (NUREP) e Proprietas, e pelo Prof. Dr. Tel Amiel (FE/UnB), Coordenador da Cátedra UNESCO em Educação a Distância.

O texto parte de uma interpretação não restritiva da Lei de Direitos Autorais (1998). Ao longo do texto os autores apontam decisões judiciais, normas institucionais, exemplos de políticas e outras normativas que vão ao encontro essa posição, defendendo um equilíbirio entre a proteção e o acesso, a exclusividade e a liberdade de usos. A principal recomendação do Guia é que, nesse momento, é “imprescindível que instituições se organizem para deliberar e definir diretrizes que são essenciais para a educação aberta e a distância”.

Diversas perguntas importantes são abordadas, incluindo:

  • As normas de direitos autorais que valem para o ensino presencial também se aplicam no ensino online?
  • Que tipos de materiais docentes podem usar no decurso de suas aulas?
  • Posso usar de material preexistente de terceiros na produção de material educacional novo?
  • Posso adaptar material existente – didático ou não – para fins de permitir a acessibilidade por pessoas com deficiência?
  • No caso de uso de material de terceiros, como fazer a atribuição de créditos?
  • Artigos, livros e outros recursos de terceiros podem ser disponibilizados em plataformas institucionais para uso em aulas?

Acesse o guia, que tem uma licença CC-BY, e está em formato PDF. 

Planilha comparativa destaca exceções e limitações aos direitos autorais no Mercosul

Documento integra a agenda de colaboração firmada em 2018 entre países do MERCOSUL para a disseminação da pauta da educação aberta na região


A partir de agora ficou mais ágil consultar quais são as exceções e limitações aos direitos autorais em diferentes países da América Latina. Uma planilha criada pelo Núcleo de Recursos Educativos Abertos y Accesibles do Espaço Interdisciplinar (UdelaR /Uruguay), em parceria com a Cátedra UNESCO em EaD (Brasil), acaba de ser disponibilizada e abrange, inicialmente, a região do MERCOSUL.  Trata-se de um dos desdobramentos do documento de cooperação resultante do Seminário REA do Mercosul, organizado pela UNESCO em 2018.

“Entendemos que, dada a complexidade do tema e a necessidade de informação sistematizada, a planilha será muito útil para organizações educacionais e culturais (bibliotecas, arquivos, museus), assim como empresários, pesquisadores, jornalistas, dentre outros atores”, explicou Patricia Díaz Carquero do Núcleo REAA.

A planilha, organizada em três tabelas, resultou do projeto “Acesso ao conhecimento e à cultura no MERCOSUL” do Núcleo REAA da UdelaR e integra a Tese de Mestrado em Relações Internacionais da advogada e Mag. Patricia Díaz Charquero.

A planilha pode ser acessada aqui. Veja uma análise dos dados no site da Cátedra UNESCO em EaD.

Centro de formação de servidores da Câmara deve criar política de REA

Em uma ação inédita, o CEFOR – Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados solicitou ao Educadigital uma formação ampla, de um dia todo, para cerca 100 pessoas, com palestra e oficina sobre como implementar uma política institucional de educação aberta e recursos educacionais abertos na instituição. O CEFOR é responsável pelo desenvolvimento de diversos cursos, incluindo alguns de pós-graduação, mestrado e doutorado em Gestão Legislativa para servidores públicos, que contemplam a elaboração de diversos materiais educacionais.



Um dos projetos mais conhecidos direcionados ao público em geral é o Plenarinho, programa de relacionamento da Câmara dos Deputados com a comunidade, voltado para o universo infantil: crianças de 7 a 14 anos, pais e professores. O programa  inclui as ações Câmara Mirim e Eleitor Mirim, bem como a produção e distribuição de material impresso. Por meio de uma linguagem acessível e lúdica, o Portal Plenarinho informa sobre o Poder Legislativo – elaboração de leis e atuação parlamentar -, política, democracia e organização do Estado. Outros temas sociais e educativos relacionados ao cotidiano infantil também são abordados, como saúde, meio ambiente, educação e lazer. 

“Queremos ser um repositório importante de recursos para a educação política e para a democracia e precisamos, então, flexibilizar essas licenças”, ressaltou a coordenadora Corina Castro de Oliveira. Além de contar com a participação de servidores da Câmara e do Senado, o evento, realizado no dia 3 de maio em Brasília, foi estendido a diversos órgãos da administração pública, tais como Ministério da Educação e FNDE, Superior Tribunal Federal, Tesouro Nacional, Ministério do Planejamento, Ministério Público do Trabalho, dentre outros. “O interesse por educação aberta vem crescendo não apenas nas pastas responsáveis por política de educação, mas também nas instituições públicas que produzem seus próprios materiais educativos”, apontou Priscila Gonsales, diretora do Educadigital, uma das facilitadoras da formação.

Projeto de Lei REA aprovado na Comissão de Educação

Texto substitutivo da deputada Margarida Salomão ao Projeto de Lei nº 1.513/2011 foi aprovado dia 5 de dezembro na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados


A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade nesta quarta-feira, dia 05 de dezembro de 2018, o Projeto de Lei nº 1.513/2011, cuja relatoria foi realizada pela deputada federal Margarida Salomão (PT/MG). O referido Projeto, cujo objetivo é introduzir na legislação brasileira o incentivo à adoção dos Recursos Educacionais Abertos (REA) na política pública nacional, teve substitutivo apresentado para atender às recomendações dos documentos internacionais mais recentes como o Plano de Ação de Liubliana, resultado do 2º Congresso Internacional de REA da UNESCO, realizado em 2017.

O Projeto estabelece os procedimentos a serem adotados pelo poder público na contratação, produção, subvenção e de recursos digitais, para que sejam licenciados e disponibilizados com licença aberta de direito autoral. Ou seja, materiais educacionais nos mais diversos formatos, quando financiados ou subsidiados por fundos públicos devem ser, necessariamente, recursos educacionais abertos, e estar disponíveis para toda a sociedade. O texto substitutivo foi reformulado com apoio dos gestores do MEC envolvidos na execução do Compromisso de Recursos Educacionais Digitais da Parceria de Governo Aberto (OGP-Brasil), que gerou a Portaria MEC 451 de 16 de maio de 2018.



Na semana anterior à aprovação, o Projeto foi apresentado no Seminário REA do Mercosul, organizado pela UNESCO e pelo MEC, com apoio da Iniciativa Educação Aberta. A deputada Margarida Salomão esteve presente na plateia. “Os recursos educacionais abertos são hoje, em todo o mundo, uma alternativa para equilibrar o respeito aos direitos autorais, o direito de acesso à informação e à cultura e o direito à educação de qualidade no contexto da cultura digital”, destacou a parlamentar durante o debate, complementando que pretendia apresentar o projeto para aprovação na semana seguinte.

A implementação de políticas de Educação Aberta e REA  tem crescido no mundo todo, baseada na convicção de que todo o material que é financiado por recursos públicos deve estar acessível a todos. Nos Estados Unidos, no estado da Califórnia, as compras públicas de livros já dão prioridade a obras didáticas com licenças livres, e o estado de Washington decidiu publicar na internet, em formato de REA, todo o material curricular, por meio do projeto Open Course Library (Biblioteca de Cursos Abertos). A Polônia tem um dos programas mais reconhecidos de livro aberto do mundo. A Eslovênia adotou uma política pública de estado para a educação aberta, denominada Opening Up.

A disponibilização de recursos educacionais com licenças abertas no Brasil também fortalece a nascente Estratégia Digital Brasileira para a Educação (MCTic), que traz um capítulo sobre a importância dos REA, e a representação do Brasil no Open Government Partnership (OGP), além de reforçar o comprometimento com o objetivo de educação inclusiva, equitativa e de qualidade que está na Agenda 2030 da ONU.

Próximos passos do Projeto de Lei: comissões de Cultura e de Constituição e Justiça, acompanhe aqui

Robótica do MEC terá materiais pedagógicos abertos

Seja para uso dos alunos ou dos professores, licenciamento em Creative Commons passa a ser critério para compra pública para a área no Ministério da Educação


Mais uma vitória para a educação aberta na política educacional brasileira. O Ministério da Educação (MEC) lançou edital com exigência de licença aberta nos equipamentos e materiais de apoio pedagógico para projetos de robótica educacional que serão adquiridos por meio de compras públicas.


CC-BY-SA (https://www.flickr.com/photos/svofski/)

Por meio do Pregão Eletrônico nº 4/2018 o governo federal receberá registro de preços. Trata-se de um investimento estimado na casa de R$100 milhões de reais. Todo o material de apoio pedagógico, tanto para docentes quanto para alunos, deverá ser licenciado abertamente, fazendo uso de uma licença Creative Commons Atribuição Não-Comercial (CC-BY-NC). Isso permitirá que professores, alunos e outros interessados em robótica educacional possam adaptar, complementar, remixar e compartilhar os materiais sobre robótica livremente, desde que não façam uso comercial das obras.

Vale assistir a reportagem sobre a iniciativa, que também entrevistou especialistas que chamam a atenção para o fato de apenas distribuir equipamentos não ser o bastante, mas sim um trabalho educativo consistente. Segundo o MEC, esse investimento em robótica educacional segue a orientação pedagógica para a área recém-lançada, particularmente o Programa de Inovação Educação Conectada, que visa “fomentar o uso pedagógico de tecnologias digitais na educação básica”.

A política de licenciamento aberto adotada nessa nova aquisição vem ao encontro do trabalho de formação e apoio pedagógico a gestores do MEC que vem sendo realizada pela Iniciativa Educação Aberta e ao Compromisso #6 do 3º Plano de Ação da Parceria Governo Aberto, o que também gerou, pela primeira vez na história, um edital do Programa Nacional do Livro Didático com exigência de licenciamento aberto para o material do professor, saiba mais em PNLD 2019.

Para ter acesso à documentação do pregão de robótica, é necessário acessar o portal de Compras do governo e seguir as orientações.

Licenças Creative Commons: flexibilizando os usos das obras criativas

Sempre que escrevemos um texto, tiramos uma foto, filmamos um vídeo ou compomos uma música, automaticamente os direitos autorais são atribuídos a nós mesmo que isso não seja declarado explicitamente. A legislação brasileira (Lei 9.610/1996) protege o autor ou o detentor dos direitos autorais no momento em que a obra é criada. Ou seja, se você usar um texto, imagem, vídeo ou qualquer outro tipo de recurso, esteja publicado na internet ou não, mesmo citando a fonte, mas sem autorização prévia do autor ou do detentor legal do direito autoral, você estará infringindo a lei.

Como a internet vem revolucionando as formas como as obras criativas podem ser distribuídas e reutilizadas por toda a sociedade, a Lei de Direito Autoral brasileira vem sendo rediscutida desde 2010 e existe um projeto de reforma que foi iniciado por consulta pública. Para saber mais, leia este artigo.

Vale lembrar que a questão do direito autoral vem sendo debatida no mundo todo a partir do novo contexto da sociedade digital. Nesse processo, enquanto não ocorre a mudança necessária, já existe uma maneira de driblar a rigidez desse sistema baseado no “todos os direitos reservados”. As licenças Creative Commons (CC) garantem o direto autoral ao autor da obra ao mesmo tempo que flexibilizam os usos que podemos fazer. As licenças CC possibilitam ao autor decidir que usos são permitidos, tais como cópia, distribuição, recombinação e adaptação

Hoje disseminado para mais de cem países (inclusive o Brasil), o CC tem respaldo legal e uma versão digital (camada HTML que permite que motores de busca como o Google consigam encontrar o conteúdo).

Escolher e adotar uma licença CC é muito fácil, basta acessar o site  e responder a duas perguntas:

  1. Quero permitir uso comercial ou não?
  2. Quero permitir adaptações ou não?

A combinação dessas respostas envolve quatro condições básicas: atribuição, uso não comercial, não a obras derivadas e compartilhamento pela mesma licença. Essas quatro condições combinadas geram 6 tipos de licença que vão da mais flexível à mais restritiva:

  • CC-BY (atribuição): permite que outros distribuam, recombinem (remixem), adaptem ou criem obras derivadas, mesmo que para uso com fins comerciais, contanto que seja dado crédito ao autor.
  • CC-BY-SA (atribuição + compartilhamento pela mesma licença): permite que outros remixem, adaptem e criem obras derivadas ainda que para fins comerciais, contanto que o crédito seja atribuído ao autor e que essas obras sejam licenciadas sob essa mesma licença.
  • CC-BY-NC (atribuição + uso não comercial): permite que outros remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho para fins não comerciais, e embora os novos trabalhos tenham de lhe atribuir o devido crédito e não possam ser usados para fins comerciais, os usuários não têm de licenciar esses trabalhos derivados sob os mesmos termos.
  • CC-BY-ND (atribuição + não a obras derivadas): permite a redistribuição, comercial e não comercial, desde que o trabalho seja distribuído inalterado e no seu todo, com crédito atribuído ao autor.
  • CC-BY-NC-SA (atribuição + uso não comercial + compartilhamento pela mesma licença): permite que outros remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho para fins não comerciais, desde que atribuam a você o devido crédito e que licenciem as novas criações sob termos idênticos.
  • CC-BY-NC-ND (atribuição + uso não comercial + não a obras derivadas): permite que outros façam download dos seus trabalhos e os compartilhem, desde que atribuam crédito a você, mas sem que possam alterá-los de nenhuma forma ou utilizá-los para fins comerciais.

É muito importante que a licença escolhida esteja visível no material e, ao publicá-lo na internet, é igualmente importante usar o código html que o gerador de licenças dá na página web de publicação. Dessa forma, sempre que alguém usar motores de busca como Google, que oferece a opção de pesquisa por direito autoral em sua busca avançada, vai encontrar a sua obra no tema pesquisado.

Se você usa serviços como Youtube, Vimeo, Flickr, Picasa, Slideshare, Scribd, Soundcloud, Wikimedia Commons também é possível escolher a opção de filtrar conteúdo apenas com licenças Creative Commons na busca avançada, além, é claro, de escolher uma licença ao fazer o upload do arquivo.

Apesar dos avanços e de um número cada vez maior de pessoas que entendem e adotam licenças abertas em suas obras criativas, ainda pode ser um pouco confuso entender o que de fato significam as licenças e como referenciar as obras corretamente. Uma maneira de identificar sites que contenham licenças CC e de ver como fazer a atribuição é usar O Open Attribute, uma extensão que funciona em seu navegador de internet e marca o endereço URL com um símbolo CC, caso exista material licenciado na página visitada.

Encontrar material licenciado abertamente ainda é um desafio, mas já existem diversas opções para quem busca repositórios, imagens, vídeos, apresentações, documentos e etc. O site REA.br criou recentemente a seção “Mão na Massa” que traz um levantamento de locais em que se pode encontrar material aberto.

As licenças CC são perpétuas e gratuitas, ou seja, não têm data de validade e não é necessário fazer qualquer pagamento para a  utilização. Ao usar esse tipo de licença declaramos ao mundo a nossa vontade de uma maneira legal, contribuímos com a disseminação do conhecimento e contribuímos com o espírito colaborativo da internet convidando outras pessoas a fazer parte dessa cultura. Veja aqui um pequeno vídeo sobre CC:



Para saber mais:
Creative Commons – https://creativecommons.org/licenses/

Branco, S., Britto, W. O que é Creative Commons? Novos modelos e direito autoral em um mundo mais criativo. Acesso em 18 maio de 2015.

O Estado do Commons

Na sua essência, o Creative Commons é uma ideia simples. É a ideia de que quando as pessoas compartilham sua criatividade e conhecimento com o outro coisas incríveis podem acontecer. Não é uma ideia nova. As pessoas adaptam e constroem sobre o trabalho de outros por séculos. Músicos usam batidas da música de outro autor. Artistas criam novas obras a partir de imagens de outras pessoas. Professores trocam atividades e planos de aula entre si.

O Creative Commons acredita que o compartilhamento é uma das formas que a sociedade tem de crescer, é como a cultura se desenvolve e como a inovação acontece. Acreditamos, também, que o direito autoral pode muitas vezes ficar no caminho, geralmente sem a intenção do portador dos direitos autorais. É por isso que a licenças Creative Commons foram criadas.

Milhões de criadores usam as licenças do CC para dar aos outros permissão para usar o seu trabalho. Esses milhões de usuários são a prova de que o Creative Commons funciona.

Mas medir o tamanho dos Commons sempre foi um desafio. Não há nenhum repositório central ou catálogo de obras licenciadas pelo CC. Portanto, é impossível dizer com precisão quantos trabalhos licenciados existem, onde se encontram as pessoas que estão usando as licenças Creative Commons e como estão usando.

Este relatório dá um grande passo em direção a uma melhor medição do tamanho dos Commons. Todos os dados e metodologia estão compartilhados aqui.

Fonte: State of the Commons

Infográfico: O Estado do Commons

O ‘Pequeno Príncipe’ é de (quase) todos

Texto Sérgio Branco | Fonte Brasil Post | Licença Todos os direitos reservados

Anualmente, em primeiro de janeiro, o mundo comemora o dia do domínio público. A data é importante porque marca o momento em que obras, antes protegidas por direitos autorais, podem ser usadas independentemente de autorização ou pagamento. Neste ano, entraram em domínio público as obras de Antoine de Saint-Exupéry, Edvard Munch, Glenn Miller e Eliseu Visconti, entre outros.

Na prática, o que isso significa? O que pode ser feito com músicas, livros, filmes e pinturas que ingressam em domínio público? Com o término dos direitos econômicos, qualquer pessoa fica livre para:

a) usar a obra original, inclusive com fins lucrativos;

b) modificar a obra original, fazendo adaptação, tradução, remix, de modo quase ilimitado, também com fins lucrativos, se assim desejar.

É importante observar que o nome do autor da obra que entra em domínio público precisa sempre ser mencionado, mesmo que tenha havido grande modificação em seu trabalho. Por isso, se você decidir adaptar um livro de Shakespeare ou de Machado de Assis para qualquer mídia ou formato, pode fazer sem medo, mas precisa informar o nome do autor da original que você está adaptando.

E o ingresso em domínio público das obras de Glenn Miller, Exupéry, Munch e Visconti, entre outros, vale no mundo inteiro? Não. Cada país precisa decidir como contar o prazo de proteção. Em razão de tratados internacionais, o prazo mínimo geral é de 50 anos a partir da morte do autor. O Brasil adotou o prazo de vida do autor mais 70 anos para todas as modalidades, menos fotografias e obras audiovisuais, cujo prazo de proteção também é de 70 anos, mas contados da divulgação da obra (ou seja, fotos e filmes divulgados até 1944 também entraram em domínio público no Brasil em 2015).

Por isso, é verdade que os trabalhos dos autores mencionados no início do texto ingressaram em domínio público no Brasil, na União Europeia, na Argentina, na Austrália e em todos os países que adotam a regra dos 70 anos. Contudo, há exceções. Na Colômbia, que prevê proteção por 80 anos após a morte do autor, a obra pode entrar em domínio público só em 2025, dependendo da regra aplicável a obras estrangeiras. A mesma lógica se aplica à Costa do Marfim (prazo de 99 anos depois que o autor morre) e ao México (vida do autor e mais 100 longuíssimos anos).

O caso mais polêmico deste ano é o ingresso em domínio público do “O Pequeno Príncipe”, um dos maiores fenômenos editoriais de todos os tempos. Como se pode perceber, o esgotamento dos direitos econômicos sobre a obra depende do lugar em que a proteção é reclamada. Em países que protegem direitos autorais por menos de 70 anos (Canadá e Coreia do Sul, por exemplo), o livro já não está mais protegido pelo menos desde 1995. Por outro lado, em países como Colômbia e México, talvez só daqui a alguns anos. Pela lei brasileira, o livro está em domínio público porque o Brasil aplica a todas as obras do mundo o prazo de sua própria lei. Assim, não importa a origem da obra, o prazo aplicado será sempre o de setenta anos após a morte do autor. Essa regra é permitida nos termos dos acordos internacionais e se encontra expressa na lei brasileira de direitos autorais (lei 9.610/98, art. 2º).

Na França, contudo, existem prazos de prorrogação de direitos de autor por conta das guerras mundiais do século XX. Como as obras intelectuais não puderam circular adequadamente nos períodos de conflito, o legislador decidiu aumentar o prazo de proteção em 6 anos e 152 dias para compensar os danos da Primeira Guerra Mundial e em 8 anos e 120 dias para os da Segunda. Além disso, foram conferidos 30 anos extras para o caso de o autor ter morrido em combate. Por isso, caberá ao intérprete da lei francesa definir qual regra incide no caso. Não será a primeira vez que a corte da França precisará analisar a questão. Por conta das prorrogações de guerra, nos anos 1990 o poder judiciário francês teve que decidir se os quadros de Monet ainda estavam protegidos. De toda forma, como as prorrogações valem apenas na França, não devem causar qualquer impacto no Brasil.

Para o ano que vem, esperem ainda mais polêmica. Em 2015, completa-se o prazo de 70 anos da morte de Hitler. Por isso, em 01 de janeiro de 2016 ingressa em domínio público o “Mein Kampf” (além de todas as pinturas de Hitler – de talento duvidoso, segundo os críticos). Por enquanto, os direitos autorais sobre o livro pertencem ao governo alemão, que se empenha em proibir qualquer reprodução da obra. Claro que em alguns países, a obra já não está mais protegida, mas a grande questão é o ingresso em domínio público na Europa. A partir do ano que vem, quando for possível a apropriação do “Mein Kempf” inclusive por grupos extremistas europeus, estaremos diante de um interessante e raríssimo caso em que o domínio público promove o acesso lícito a uma obra indesejada. Neste momento em que se discute tanto liberdade de expressão, o que não vai faltar é assunto.

Sérgio Branco é diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro e doutor em Direito Civil pela UERJ.