Texto publicado em Agência FAPESP
Quando se trata de abertura da ciência, é fácil defender o livre acesso aos artigos científicos e dados de pesquisas. Mais difícil é colocar isso em prática. Em linhas gerais, essa foi a posição dos três palestrantes que participaram da conferência “Science as an open enterprise: open data for open science”, realizada na sede da FAPESP, em São Paulo, reunindo o editor-chefe da revista Nature, Philip Campbell, o químico Martyn Poliakoff, secretário de Relações Exteriores da Royal Society (a academia de ciências britânica), e o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz.
“É muito fácil falar em ciência aberta”, afirmou Campbell, o sétimo editor da história da influente revista científica britânica, criada em 1869. “Mas é preciso pensar também nos custos, no crescimento do número de dados e publicações, na manutenção desses dados e em como melhorar a confiança na ciência”, complementou o editor.
Campbell é um dos integrantes do grupo de trabalho que preparou o relatório Science as an open enterprise: open data for open science, um documento de 105 páginas da Royal Society, lançado em junho de 2012, analisando os desafios e as oportunidades trazidas pelas novas formas de reunir, armazenar, manipular e transmitir os dados e informações sobre pesquisas científicas.
O relatório aborda como os cientistas precisam se adaptar às mudanças nos cenários tecnológico, social e político e reúne recomendações a pesquisadores, universidades e institutos de pesquisa, agências de fomento, governo, editoras de revistas científicas, associações e organismos profissionais.
Para Campbell, que é graduado em engenharia aeronáutica pela Universidade de Bristol, com mestrado em astrofísica e doutorado em física atmosférica, não basta apenas deixar os dados disponíveis para todos na internet. É preciso torná-los acessíveis, inteligíveis e reutilizáveis. E isso tem custo.
Ele citou, entre outros, o exemplo do Worldwide Protein Databank, repositório mundial com informações sobre as estruturas em três dimensões das grandes moléculas biológicas, incluindo proteínas e ácidos nucleicos, cujo projeto tem um custo total de cerca de US$ 12 milhões por ano e emprega 69 funcionários.
A própria Nature não tem todo o conteúdo aberto e para ler os seus artigos é preciso ser assinante – Campbell contou que o número de assinantes caiu do pico de 72 mil para cerca de 50 mil e aponta que no futuro a versão impressa provavelmente deixará de existir.
A revista adota o chamado padrão de acesso “verde”, nas quais as versões finais dos autores dos artigos ficam disponíveis (para os autores publicarem em qualquer outro lugar, incluindo em blogs próprios) apenas depois de um determinado prazo após a publicação original na revista. Em geral, segundo Campbell, o prazo exigido pelas publicações é de 12 meses. A Nature pede seis meses.
Há também o chamado acesso “ouro”, segundo o qual a versão final de um artigo fica totalmente disponível a todos a partir do momento da publicação e não há barreiras de assinaturas – pode ser reusável por qualquer pessoa em qualquer circunstância.
“Existe ainda o modelo híbrido, que são as revistas que combinam as assinaturas com uma opção de acesso ouro aos autores que pagam para deixar o acesso livre ao seu artigo, como ocorre na Nature Communications, afirmou Campbell. Segundo ele, o preço cobrado ao autor era de US$ 5 mil em 2012.
O editor indica que a tendência das revistas do grupo Nature é se tornarem híbridas. “Os editores querem isso, mas estão sujeitos à viabilidade financeira”, disse.
A conferência contou com a presença do presidente da FAPESP, Celso Lafer, e de José Arana Varela, diretor-presidente do Conselho Técnico-Administrativo da Fundação. Varela e Poliakoff foram os moderadores do evento.
Artigos de pesquisas apoiadas
Brito Cruz comentou que várias iniciativas no Brasil têm avançado no sentido da abertura dos dados do mundo da ciência, mencionando os bancos de dados brasileiros já disponíveis gratuitamente na internet. “Acesso aberto não é algo completamente novo para nós aqui”, afirmou.
O diretor científico da FAPESP citou as informações abertas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do currículo Lattes, da Biblioteca Virtual e do programa SciELO (FAPESP/Bireme), “um dos maiores repositórios de publicações científicas do mundo”.
“Não há muitos países com esses tipos de dados completamente abertos para qualquer um em qualquer parte do mundo. Nós, no Brasil, pensamos que é a norma, mas não é”, disse.
Brito Cruz também falou sobre a política de acesso aberto já aprovada pelo Conselho Superior da FAPESP, que estabeleceu a criação de um repositório para a publicação de todos os artigos de pesquisas que receberam apoio da FAPESP.
“Os resultados de auxílios e bolsas financiados pela FAPESP terão de estar lá, seguindo as normas de cada revista científica onde o artigo foi publicado originalmente. Se o artigo tiver sido publicado na Nature, por exemplo, terá de aguardar seis meses”, disse. Segundo ele, o repositório deverá ficar pronto no segundo semestre de 2013.
Continue lendo aqui.